terça-feira, 27 de dezembro de 2011

2- O VIAGRA DE BUDA



Essa cultura que aposta na eternidade do corpo, tenta de todas as formas eternizar o gozo e o prazer do corpo. O que não o satisfaz é decadente, é demonde, é fora de lugar.
No entanto, desde Platão, ou antes, dele sabe-se que a voracidade e a saciedade do corpo são efêmeras. Alimento-me agora, mas daqui a pouco, tenho fome outra vez, bebo agora e daqui a pouco tenho sede de novo. É da natureza fisiológica do corpo não se satisfazer, não se saciar, mesmo porque, os corpos saciados são de espécimes extintos. Num processo evolutivo, a espécie que ficou satisfeita foi superada, ou foi dizimada. O corpo em contato estreito e permanente com a natureza chama e conclama à luta, à batalha pela sobrevivência. Nietzsche já dizia que tudo o que vive quer permanecer. Isso vai da bactéria, a baleia, todo corpo deseja permanecer e entre a permanência do meu corpo e a de outra espécie, dizima-se a da espécie oposta. As leis e regras do corpo são simples: ele deseja sobreviver, sobre quaisquer inteperies e espécies. O gozo e satisfação dele são absolutos. A questão é que o homem saciado é um homem pela metade, vazio, morto, já que os prazeres e a saciedade do corpo não o preenchem por muito tempo. Pelo próprio processo evolutivo, o corpo não pode se saciar e sempre tem que querer mais.
Todavia, acreditar que se ira eternizar o corpo gera vazios enormes, faltas e carências enormes como as que vivenciamos hoje. Como lidar com esse vazio? Como dar conta desse vazio? Música alta? Consumir objetos? Tornar o outro objeto a ser consumido? Fazer-me objeto e me consumir, ou até mesmo me vender?
Essas são questões que revelam, já que deflagra e aponta a falta de uma instância e dimensão que não se pode olhar, ver, entrar em contato. Assim, para o corpo se tem tudo, se tem muito, até sistemas religiosos que oferecem a criptogenia, ou outros métodos tecnologicamente menos sofisticados, mas que prometem o gozo material sem dor ou sofrimento. Sem dúvida a maior invenção do capitalismo foi tê-lo associado à dimensão do desejo, foi tê-lo colocado na dimensão da satisfação do corpo. Isso o faz andar, mesmo que nunca se chegue a nenhum lugar. Ou melhor, chega-se no vazio e nele, a saída é a transcendência pelo corpo, mas não do corpo. Ou de fato alguém acredita que a tecnologia nos fará vampiros? Eternos? Alguém acredita na juventude perene da Barbie?

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

1-a ilusão da imortalidade: Buda x o Viagra.



 São três textos que tentam dialogar entre si, abraços em todos.

Conta o mito, que o rei, sabendo das previsões para seu filho, resolveu mantê-lo dentro do palácio, longe da velhice, da doença e da morte. E conseguiu esse feito por mais de três décadas, quando o próprio pai do príncipe adoeceu e caminhava para o falecimento. Nesse ínterim, diante de uma curiosidade tardia, o príncipe resolve sair dos portões do palácio e nisso descobre a velhice, a morte, a doença. Retorna atordoado, porque sabe que vivia uma ilusão. Pior, sente-se enganado e desesperado, já que não sabe como ajudar o seu povo, não sabe nem como ajudar a si mesmo. O jovem Sidarta, esse era o seu nome, passado algumas noites, despede-se de seu pai, de sua esposa, de seus filhos e parte para fora dos muros do palácio. Peregrina e encontra uns monges ascetas que para se livrarem da morte, da velhice e da doença, meditavam por um lado e negavam o mundo por outro. Anos passam até que ele abandona esse caminho e em sua despedida, sentado debaixo de uma árvore, uma maça cai na sua cabeça, ou terá sido uma figueira? Fato é que ele desperta como Buda, o Iluminado. E a sua iluminação se faz mediante um discurso denominado o Caminho do Meio.
Paro de falar de Buda, mas o trago para pensarmos juntos a sociedade atual, pensá-la por um enfoque, já que há inúmeros outros, graças a Buda.
Numa busca por um entendimento rasteiro, o palácio, a estadia de Sidarta no palácio pode simbolizar o ego na sua identificação com o corpo. A sua saída do palácio, pode simbolizar a busca de alguma coisa que tem em nós. Alguma coisa que deseja a transcendência e sabe, ou não sabe, como a gente a alcança. O encontro dele com o ascetismo pode simbolizar o momento no qual o ego se identifica com o oposto, nega o que se foi, busca, radicalmente, um novo ser. E, finalmente, podemos insinuar, que o despertar ocorre, quando ego, corpo, alma, espírito se integram. A integração longe de ser uma mera fusão e simbiose é o reconhecimento tácito e sutil dos limites de cada componente.
Colocadas essas bases posso fazer a travessia na barca de Hesse e chegar ao século XXI. O corpo não quer morrer, não quer perecer. O corpo deseja a eternidade e a forma lógica com que o corpo pensa o eterno é a tautologia dele mesmo, no caso, a reprodução. Se tiver filhos, eu serei eterno. Este corpo (masculino) então parte para o ataque, quanto mais mulheres ele conseguir melhor. Mas, se este desejo do corpo é infinito, a realidade do prazer é finita. Ele não dá conta de todas as mulheres, de todos os homens, de sustentar e amparar todos os filhos. O desejo dele é insaciável, mas as suas condições são finitas. Pelo menos era assim. Havia um momento na vida humana na qual o corpo não bastava a si mesmo. Diante das limitações que ele imponha e colocava, os seres buscavam uma transcendência. Hoje....
Temos toda uma indústria farmaceutica que busca encapsular a eternidade. Tentam persuadir a todos que a morte é uma falácia, nenhum corpo precisa de morrer e prolonga-se a vida. Ainda que cada vez mais viver perca o sentido, mas vive-se, recusa-se a morrer e o que faz parte da mesma estratégia, recusa-se envelhecer. Assim, na mesma corrente tem a indústria dos cosméticos que sonham em produzir o elixir da juventude. Ser eternamente jovem é a idéia salvifica do corpo que hoje encontra respaldo na tecnologia da ex-tetica. E qual é o símbolo maior da vitalidade humana, senão o sexo.
Assim, também se vende a esperança do sexo eterno. O Viagra é um sucesso. O prazer químico, a excitação química, não importa se não sinto desejo pelo ser que possuo, ao tomar a pílula azul, o pênis fica rijo, endurecido de um desejo que nem carece ser meu e a copula acontece. A salvação de mim mesmo, mediante a reprodução de novos corpos se faz eterna, já se fazia anteriormente com a inseminação artificial, que garante a gravidez para mulheres acima dos 40, dos 50 anos. Mas, agora, ela acontece, pode acontecer pelas vias “naturais” da copulação e não pela frieza tecnológica.
Enfim, a tecnologia quer eternizar o corpo e poderíamos falar ou pensar os atletas, dos dopings e outros casos, mas a idéia é contrastar tudo isso ao esvaziamento da morte, da dor e da velhice. Ambas estão sendo varridas para debaixo do tapete, similar ao que o pai de Sidarta fez com ele para que seu filho nunca fosse Buda, ou alguém imagina Sidarta, o Buda, tomando Viagra?