quarta-feira, 30 de maio de 2012

MARCHA DA MACONHA E MARCHA DAS VADIAS.




Nas duas últimas semanas, segmentos da sociedade brasileira resolverem caminhar, se mover, se mobilizar, reivindicar. Sem dúvida que isso é belo e importante para construção do jogo democrático, mas.... reputo complicado a marcha da maconha.

Podemos utilizar como argumentação favorável a marcha que o álcool é socialmente mais prejudicial, que o cigarro é mais nocivo, que o sucrilhos e o Big-Mac também são uma droga. Podemos utilizar pesquisas de notabilíssima relevância teórica e econômica que apontam que a liberalização das drogas, não só da maconha, acabaria com o poder do trafico, possivelmente, gerando renda para o Estado, como se dá com a própria industria do cigarro e do álcool. Todos esses e outros são argumentos, sem contar um mais precioso ainda, o corpo é do usuário e pode-se lhe  facultar o direito de drogar-se.

O contraponto é que todos esses argumentos são da esfera da individualidade, da privacidade, dos direitos individuais e como sabemos, vivemos em sociedade. Os direitos sociais são regulados pelo direito coletivo e é essa tensão e embate que alarga a respeitabilidade do individuo enquanto cidadão e da sociedade enquanto Estado Democrático. De modo que, sendo inteiramente contra a marcha, achando até que a mobilização é fútil, torpe e banal, temos que respeitar o avanço civil de nossa sociedade de conceder um direito legitimo de usuários mobilizarem-se. É uma manifestação política e de expressão legitima, que não pode ser cerceada (embora discordemos), como bem colocou o supremo. 

Não obstante, temos que enfatizar, que lutar pela legalização da maconha é tacitamente defender o tráfico, os métodos e meios utilizados por eles. Legalizar a maconha é se atrelar e unir de fato a violência crescente e galopante que toma conta do mundo todo, haja vista, México e para não irmos tão longe, qualquer cracolândia de nosso país. Não se pode e nem se deve pensar a maconha fora da indústria da violência. Ela não é uma erva natural, há muito deixou de ser, de maneira análoga que há muito a coca, perdeu seu significado cultural, assim como o Daime vem perdendo também ao ser utilizado no centro das capitais por qualquer um que pague ou deseje. De modo que o econômico colonizou, desvirtuou e corrompeu toda ingenuidade e pureza que alguns usuários querem defender. 

Na direção oposta da marcha da maconha vem a das vadias. Não pude estar ao lado delas, caminhando junto contra o discurso opressivo e opressor que não apenas legitima a violência como ainda culpabiliza de forma covarde a vítima. Esse discurso dos “conquistadores” oprime duplamente, primeiro pelo ato, depois pela legitimação ideológica da ação. Nesse aspecto avançamos pouco, em verdade, não avançamos quase nada. O crime contra o negro não é tido como pratica de racismo e sim de injuria. O crime contra os homossexuais não são vistos como homofobia e sim agressão. Os crimes contra os irmãos do candomblé e da umbanda não são encarados como religiosos. Nessa toada, como não poderia deixar de ser diferente ao valer-se dessa ótica opressora, os crimes contra as mulheres acontecem, porque elas são vadias. Pelo menos foi isso que o policial canadense expressou verbalmente, dando de certa forma voz e rosto ao que uma infinitude de homens e mulheres pensam. 


Tudo isso é um discurso covarde que retira duplamente a condição de sujeito do outro; primeiro no ato e depois ao transformar a vitima em culpada. O fato é que não compreendemos e aceitamos que a mulher ao ser estuprada é vitima, ainda quando ela estava nua em pleno clássico no Mineirão, dançando Funk até o chão. E não aceitamos a sua condição de vitima ao ser estuprada, porque não reconhecemos negros, homossexuais e mulheres como iguais a brancos, heteros e homens. Não aceitamos porque se  pode tolerar que as mulheres ocupem posição de liderança na sociedade, não aceitamos que elas se sintam ou sejam donas do próprio corpo. O corpo das mulheres é na mentalidade da maioria dos homens a primeira e definitiva propriedade privada que eles têm e possuem, literalmente até. Seguindo essas pegadas vamos em direção da violência domestica. 

Mas, quero enfocar a marcha salientando como a caminhada para a cidadania é longa e contraditória, confusa e obnubilada. Por um lado, um segmento da sociedade marcha para que seu direito de utilizar entorpecentes ilícitos seja legalizado. Por outro lado, luta-se, ridiculariza-se até para que se tenha assegurado o direito de ser respeitada independente das vestimentas, ou para além delas. Em comum entre as marchas há a relação corpo e os direitos do próprio corpo, seja de drogar-se, seja de despir-se. E é nessa simetria dada entre o escamotear-se ou se revelar, que as dimensões do desejo em nosso diálogo com o prazer se revelam. É no nível do prazer e do desejo que as marchas dialogam com a sociedade civil.  

Na primeira marcha são os usuários nos dizendo que querem introjetar no próprio corpo substâncias que lhes dão prazer. Nisso há uma liberdade que quer se afirmar individualmente em detrimento do social.  Em oposição há as mulheres que lutam coletivamente para que sejamos capazes de reconhecer a individualidade do desejo, do prazer que lhes assistem. Elas marcham para que o corpo delas seja considerado expressão do desejo delas e não de maridos, pais, filhos e menos ainda de outros homens e em hipótese alguma, de um usurpador, de um estuprador, seja este de corpo ou de almas. Em primeira e última instância, elas marcham para que seus direitos de pessoa humana sejam reconhecidos e validados individualmente. Já os usuários marcham em primeira e em última instância para que o prazer ou vicio (ilícito) deles sejam validados coletivamente, em suma querem dar baforadas de maconha em nossas caras. Quer me parecer que embora tudo seja uma marcha com conotação politica, nós enquanto sociedade temos que defender às vadias, descriminalizar o usuário e abraçar a democracia.  

Bjs e tomara que entre as marchas, apesar do nome ousado e provocativo, a das vadias aumente a cada ano, assim como o respeito as mulheres.  











domingo, 13 de maio de 2012

SEPARAÇÃO Si- para-AÇÃO.




Quando me separei, eu era um mim, sem melodia. Uma cacofonia, um sem número de cacos, de partos, de destruição. Quando eu olhava para trás, eu via apenas o ponto, ou os pontos nos quais ecoavam o maior erro da minha vida. E como eu não podia deixar de ser dramático, refletia que o relacionamento fora o maior erro de todas as minhas vidas, afinal, tristeza pouca é bobagem.

Naquele tempo toda mulher era para mim a imagem da traição. Eu corri de mulher por quase um ano. Se elas me tocassem então, eu já esperava onde seria o bote. Mulher e serpente passaram a ser sinônimo. Mulher- “a verdade é o seu dom de iludir./ Como podes querer que a mulher vai viver sem mentir...”

Ia vivendo assim até que um dia, dentro da nossa sala de mestrado, algo em mim despertou para uma jovem moça.  Algo em mim sorriu para ela. O inusitado é que era uma sala com mais de 20 mulheres. Poderia ter despertado para alguma solteira, mas apaixonei-me por uma que namorava. Na verdade, o ponto não é que ela namorava e sim que ela era fiel. Pelo menos, em relação as minhas investidas, ela manteve-se, sexualmente, fiel ao namorado dela.

O inesperado é que essa moça recuperou a minha confiança em todas as mulheres do universo, até nas adulteras, até nas filhas da prostituta. Ela salvou em mim todas as mulheres. Fico pensando que se naquele momento rolasse algo entre nós, provavelmente, eu a apedrejaria. De certa forma era como se uma parte minha quisesse me convencer de que todas as mulheres traem, mentem. E o fato de ela ter agido diferente, me ajudou a recuperar algo que me tinha sido tirado. A agradeço pelas coisas ter tomado o rumo que tomou.

Mas escrevo, porque muitas amigas separam-se. Quero falar para elas: viva o luto. Separar dói, machuca, arde, sangra, mas passa. Os dias nos quais nada tiver graça, o tempo ficar interminável: mate imageticamente o seu amado com requintes de crueldade cada vez maior. Aquele que separou, que foi traído e não matou o ser amado pelo menos de vinte formas diferente, jamais amou. Eu rio das imagens com as quais eu assassinava minha ex-esposa, porque mais tarde fui ver a carga erótica que tinha cada uma dessas cenas, a passionalidade que tinha em cada uma delas. E a cada assassinato, elas iam indo embora. Eu me esvaziava dela e me preenchia de algo que somente a separação te ensina e lhe restitui.

E a separação nos ensina a nunca mais separar-se da gente mesmo. Por isso viver o luto é bom e importante. A medida que você vive o luto uma coisa cresce novamente em você. Aqueles cacos, retalhos, fragmentos, uns são perdidos e lançados no nada. Outros colam, se ajustam, se unem e nunca mais desgruda da gente, descola de nós. São as partes que se restitui.

Outros relacionamentos vêm, mas tem uma parte nossa que já não abrimos mão e nem esperamos ou desejamos que o outro abra. Em verdade, passamos a procurar no outro não partes que não temos e nos complementaria, mas sim partes que o outro tem e não abrira mão. Muitos pensarão, é egoísmo!! Não é muito distante do egoísmo. Como ressalta Nereida em seu livro formidável, o egoísmo é você tentar ser o centro da vida do outro, ser o umbigo da vida do outro. Ser o seu próprio umbigo, reconhecer o seu próprio centro é autocentramento. E a separação te ajudar a autocentrar-se e a reconhecer um outro que igualmente saiba do seu centro. Te proporciona a não querer ser o centro de ninguém e nem aceitar que o outro seja o seu. De fato, as pessoas não chamam isso de amor, nem de relacionamento. A visão que elas têm de relacionamento é a da novela das oito, dois que são um, dois que se fundem, que se integram, que se perdem e se com-fundem.

Enfim, depois da separação passamos a ter uma parte que não deixamos mais sair ou desgrudar de nós. É uma parte nossa que a gente nunca mais abandona, nunca mais cede, nunca mais deixa sair da gente.

A separação nos proporciona sermos, ser-para- ação. Si-parAÇÃO.