domingo, 12 de outubro de 2014

Um Amor em Paris - um pretexto para falar de parceria.





Era sábado a noite. As ruas e bares de BH agitados pelo calor e pela curtição de mais um fim de semana. Brisa me aguardava para irmos ver uma exposição ou um filme. Pelo tardar das horas a exposição tinha acabado, restava um filme que não tínhamos idéia de qual estava em cartaz. Vimos, lemos e ficamos entre três. Eliminado um, optamos pelo filme AMOR EM PARIS.

O filme dizia respeito a temática que vou tratar no curso vivencial que abri as inscrições, de forma que o filme me serve de pretexto para falar da temática que pretendo conversar, versar e ser versado ao longo do curso- parcerias. Mas, antes de chegar a elas tenho que perguntar:
O amor supera uma traição? O amor termina depois de uma traição? É possível perdoar uma traição? Existe traição? Uma traição é algo a ser compartilhado com o parceiro(a) ou algo a ser segredado no mais intimo de si mesma(o)?

O filme de uma forma bem singela, sem ter essas ocupações, acaba por responder a essas perguntas. Mais do que responder a isso, o filme explora os relacionamentos, as parcerias onde elas agarram, se desgastam, se machucam, se ferem.

A nossa personagem (Isabelle) esta lá, ao lado do marido (Xavier), com ele. Eles se amam, mas há coisas num e no outro que eles não gostam. O gostar é diferente de amar e Martin Luther King é quem nos ensina isso de uma forma muito bonita. Prega o pastor americano que Jesus nos ensina amar os inimigos e não a gostar dos inimigos, porque não tem como gostar do policial racista que solta os cachorros em cima de você e da sua esposa, não tem como gostar da discriminação e do discriminador, mas é possível amá-los. Na convivência, no partilhar a vida a dois com um outro(a), dividindo tempo, espaço em todos os níveis e muitas dimensões tem coisas que não gostamos, mas o amor permanece, continua. Pelo menos até o momento no qual o amor também não basta. E esse momento existe, embora ninguém nos alerte, nem mesmo a pessoa que amamos. Precisamos falar e contar para todo mundo que o amor não basta, que por amor as pessoas se perdem, matam, suicidam, se desesperam. Também por amor as pessoas se constroem, se reconstroem, se capacitam, se emancipam. Mas, o amor sem o outro não basta. E tem vezes que o amor chega tarde, ou cedo demais. Ahhh esse amor!!

Há um momento na relação, em que como disse uma partilhante certa vez: “a tolerância fica insuportável.” Tudo que o outro faz ganha a dimensão de agressão, de ataque. Aqueles pequenos desagrados ganham força, amplitude, tamanho, dimensão e eclipsa o amor em magoas, ressentimentos, dores, rancores, que fica difícil visualizá-lo de novo. É aqui que muitos perdem o outro, perdem a si mesmo, se machucam, se ofendem, caminham para uma direção cujo retorno fica mais difícil. É clichê dizer que nesse momento damos abertura para outras pessoas. E uma pessoa que chega nos apresentando novos gostos que esquecemos, novas alegrias que já não tínhamos dá um colorido para nosso ser que vai ocupando um espaço não preenchido, esvaziado. A partir disso tenho me feito a pergunta: é o amor um hábito? Uma rotina? Uma ocupação? Por vezes, parece que sim.



Retomando o filme, vemos o amor um pelo outro. Vemos também as tensões entre o gostar de um e outro. Vemos como o peso da rotina a acaba oprimindo, no mesmo sentido que a forma dele resolver as coisas, ou melhor, não resolvê-las, a cansa. E tudo caminha para o marasmo infinito até que um jovem chega pedindo fogo. Talvez mais levando fogo do que pedindo e isso a acende. Dá a ela uma sobre vida que ela tinha perdido, abandonado, deixado de lado, por que? Quem pediu isso a ela? Por que fazemos isso? Ela não sabe, a maioria de nós nem pensa nisso, em como que fomos abrindo espaço, dando espaço, cedendo espaço e tempo em nós para o outro(a) e de repente não temos mais a nós mesmos.

Nessa perda amplia-se a sensação de vazio, de dor, de angustia, de ausência de algo que era e não se tem mais. Esse quadro de insatisfação moderada ou profunda é tratado hoje como depressão, com base em anti-depressivos, com remédios para dormir, para controlar a ansiedade de um gosto abandonado, esquecido. Diante desse cenário ataca-se o outro(a) ininterruptamente. Acusa-se e ressente-se com o parceiro(a) por essa perda de si mesmo. Os conflitos ficam ainda maiores, porque reaver espaço ocupado por terceiros é briga inglória. Sabe terreno abandonado que o outro construiu? Pode ser barracão ou mansão, não importa, o outro(a) acha-se dono, com ou sem razão. Esse desalojar cria tensão, briga, insatisfação, mas a reflexão é: de quem é o espaço? Onde foi construído esse espaço?


Há espaços que são do outro, há espaços que são nossos, há espaços que são conjuntos. Todo o desgosto parece vir da perda desse referencial. Alguns casais só têm o dele. Outros só têm o dela. Outros perderam o nosso, isto é, aquilo que é gostoso para os dois. Mas, insisto, não sabemos disso antes de desgostarmos tanto do outro(a) que a convivência se torne insuportável. Parece que há uma interdição em falar desses espaços, desse tempo, desses gostos. Parece que há uma necessidade em cada um ficar eternamente cedendo e suportando, suportando e cedendo até que uma parte abandonada do próprio ser, grite pedindo ar, refresco, clareza, lucidez, prazer.

Essa parte gritou na nossa personagem e ela tirou dois dias para ir a Paris procurar o rapaz que conheceu na festa. O encontra, mas não acontece nada. Acontece com um terceiro vindo de um país escandinavo para uma palestra. Todavia, o marido desconfia e vai a Paris e indo, esperamos que ao vê-la saindo com outro do hotel vai fazer um barraco. Depois ao segui-la pelo metro, esperamos o mesmo, mas ele vai até o Louvre, pára diante de uma tela que recorda a sua esposa. Encontra o seu filho razão de des-gosto e tensão entre ele e a esposa, porque ele gostaria que o rapaz estivesse fazendo agronomia e o filho escolhe fazer acrobacia. E ao assistir a apresentação do filho, um dos pontos mais sensíveis do filme, porque o rapaz brinca com o ar, com o equilíbrio, com o tempo, com a leveza, ele se emociona. Conversa com o filho que ele ama, mas não gosta da escolha, ou não gostava e volta para casa.

Voltando, ele teme que ela não retorne mais, que ela tenha se apaixonado por outro. Ele teme perdê-la. Ele confidencia com um conhecido que a viu com outro e o conhecido diz que ela vai retornar porque eles se amam. E o mesmo revela o caso de amor que ela descobriu dele e também ficou perturbada, abalada, esperando o retorno dele. Ela volta. Eles não falam do assunto. Ele não toca nisso. Até que num momento depois de novamente felizes, ela descobre que ele a viu, que ele sabe o que houve. Ela também nada diz, apenas o ama mais. Na verdade, passa a gostar mais dele.

O amor precisa do gostar. Não é que ele seja um hábito, ou um costume, mas ele é um cultivar. O amor precisa ser cultivado e ele o é por gestos, por falas, por ações, por silêncios, por lembranças, recordações, projetos. O amor é cultivado junto. Ele amplia e cresce sozinho, mas a sua significação se dá no encontro com outro.

Luis Soares um amigo espiritual nos contava lá no início do ano 2000 que amor e alguns outros atributos que encaramos como sendo sentimentos são seres. O amor na concepção dele seria um ser, assim como a Harmonia, a Gentileza, a Honra e todos os outros. Sendo o amor um ser a gente precisa aprender a cultivá-lo, a engendrá-lo, a acolhê-lo. E parece que isso esta no gostar, no querer bem, no tratar bem e veja que gostar, querer bem e tratar bem nada tem a ver com poupar o outro, tem a ver com saber que o outro esta com você e você com ele, porque mesmo não gostando de algumas coisas há amor. E é somente nesse ponto que o amor basta. O amor sem cuidado com o outro, sem perder o receio de quebrar o outro não basta, não supre, é esvaziado pelo desgostar.



Finalizando, o ponto mais interessante do filme é a maturidade desse cuidado. Como que um e outro se poupam de revelar que sabe que traiu e foi traído. Como que de forma silenciosa, eles se calam e se gostam mais. Já outros casais necessitam que isso fique aclarado, colocado, posto. Parece que não tem uma fórmula para isso e nem para nada nessa vida, a não ser o respeitar o próprio gostar e a partir de uma escolha conjunta ampliar o respeito ao gostar do outro e juntos acolher e cultivar o amor. Um amor em Paris, em Bh, em nós mesmos, com o outro, com o mundo. Um amor. 


Essa temática do amor, das parcerias será apresentado por nós num curso vivencial em 4 encontros aqui em Bh. Todos os que se interessarem, sintam-se convidados para realizar as inscrições. 


2 comentários:

  1. Ola Kel!! Que gostoso. É Juliene, se lembra de mim?

    Tem como vc falar da dinâmica do curso?
    beijinhos

    ResponderExcluir
  2. Oi querida, recordo sim. Como vc está?

    Acho que no post que sucede a esse falei um pouco da dinâmica do curso.

    Serão 4 encontros teórico-práticos-vivenciais. Envio um pequeno texto, conversamos sobre ele e em seguida realizamos uma prática bioenergética, meditativa. O objetivo é nos conectarmos com nosso feminino, escutá-lo sem que para que ele seja escutado tenhamos que nos machucar e machucar a outras pessoas.
    bjs para vc e vamos nos falando.

    ResponderExcluir