quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Falando de Esquizofrenia



Ola a todos,

Este é um tema que é me é muito caro. Não sei especificar as razões, os motivos, mas a temática da loucura me mobiliza. Márcio Trindade nosso colega de lista (flordeliss@yahoogrupos.com.br) me escreveu em pvt, agradecendo o que eu havia escrito sobre um tema que hoje me escapa. Ressalto o agradecimento dele, porque ele meses antes, havia me perguntado, de onde eu tirava meus textos? Se eles não eram muito abstratos? E tive que reconhecer que sim, mas tentei explicar que a abstração nasce de uma queixa pontual, situada, concreta. O texto nasce de conversas com pessoas, de perguntas que as pessoas me fazem, de questões que elas me apresentam, dos atendimentos que realizo. De todo modo, ele me fez perceber que talvez o que escrevo só faça sentido para a pessoa que me perguntou. E ainda reputo importante escrever no plural, no geral, no universal. Escrever, justamente nesse esforço do particular ir para o universal e no universal tocar o particular, o indivíduo. No quesito loucura isso é fundamental. Sinto-me compelido a falar para eles, a falar para nós, já que me sinto um louco (que segura a onda, não dá muita pala, mas meus alunos a percebem claramente...)  
Especificamente, estes escrevinhados nascem de uma pergunta que uma pessoa que estimo muito me fez em uma conversa que íamos tendo. A pergunta (que repito ao longo do texto) sugeria uma relação entre surto psicótico e o despertar da kundalini. Isso me fez pensar em Groff e Foucault diretamente, em algumas psicografias que recebi e tratavam dos presídios, manicômios, prostíbulos e as igrejas. Nessa efervescência escrevi um texto, mas que devido ao tamanho foi fragmentado, recortado, cindido e dividido em várias partes. Todos tentam falar da loucura, ora como um louco, ora como um filósofo, mas na maioria das vezes, como um ficcionista. 

Começando...

Estou querendo postar sobre a esquizofrenia a mais de mil anos. Na verdade, a mais de três mil anos quero falar da loucura. Acho que chegou a hora. A dificuldade vai ser que eu queria um livro de 4.000 páginas de rodapé e outras 10.000 de texto. Terei que tentar escrever em duas.
Um segundo! Grato, eu fui até o armário e peguei minha camisa de força. Me encaminho para a praça publica de onde subirei em um banquinho. É de lá que eu falo para psicólogos, psiquiatras, médicos, neurologistas, anestesistas, enfermeiros, místicos. VOCES NÃO ENTENDERAM NADA!!!!! Assim me fala a voz de Caetano dentro da cabeça. E ela prossegue: GIL PIROU VOCES. OS ESQUISOS PIRARAM VOCÊS!!!
De camisa de força, eu posso falar como louco, posso esbravejar como doido. Meu discurso não tem nem terá curso, cursor e nem autoridade. Assim, posso jogar pedras em aviões, metralhar tudo que se move. Aqui começo meu discurso. É um discurso que alguns chamariam de esquisoterico, não é. Explico abaixo por que não.

Discurso Esquisotérico


No entanto, é um discurso que só pode ser absorvido se lido como ficção científica, como literatura. Peço-lhes ao menos isso. Explicando. Não é esquizoterico, porque não é um recorte, um fragmento, um delírio, uma alucinação. Não é uma linguagem inflamada e flamejante do meu ser diante da ignorância médica, humana. É pelo contrário uma tentativa de mostrar e ressaltar o que Laing (antipsiquiatra) disse na década de 70: é mais fácil uma criança inglesa entrar no hospício do que na universidade. Nós estamos enlouquecendo nossas crianças. Se isso era um nicho europeu, agora se faz mundial.


Esquizofrenia- a etimologia de um conceito.

O significado etimológico da palavra grega esquizofrenia é: eu partido, eu cindido. O problema começa na definição. Na crença de que há um Eu inteiro, coeso, estruturado e que ao se partir, que ao se cindir, isto representa uma doença, uma anormalidade.
Na maioria das pessoas o Eu se faz sem se fragmentar. Constrói-se sem rasgo, sem fendas, sem fissuras, sem traumas. Então, elas vão viver o mundo dimensional, temporal, estruturado, centrado, localizado, definido, quantificado, mensurado. Viverão suas narrativas históricas como um eu coeso, integrado, sincopado. Já em algumas pessoas, o eu vai cindir. Uma fissura vai se abrir e dessa pequena fissura, outro tempo dimensional, outra temporalidade, outra estrutura psíquica não local, indefinida (até que se localize) vai se abrir e por lá dois ou mais seres, uma ou mais vozes vão co-habitar a mesma estrutura psíquica.  
Sendo que depois que a fissura psíquica se abre nada é igual. A percepção de tempo, espaço, mundo, conectividade altera. Em alguns, essas vozes se fazem personagens, outros seres, com outras narrativas e ganham o caráter de mediunidade, ou de arte. Em outros, essas vozes serão fagocitadas pela própria psique e nessa guerra fratricida, rasgos, fissuras, cortes, fendas vão acontecendo até que praticamente uma voz se divorcia da outra, nenhuma se escuta e todas falam ao mesmo tempo, todas desejam o controle psíquico dessa mesma personalidade. O que a acaba por cindi-la, fragmentá-la. Estamos diante do que denominamos atualmente de psicose. Saindo do campo estritamente clinico e entrando no místico, muitos espiritualistas e até mesmo alguns psicólogos são unânimes em estabelecer uma relação entre surto psicótico e despertar da Kundalini. Sendo que foi essa pergunta feita para mim que me levou a criar esse texto. Vejamos:

Notas de fim: 

As duas imagens do post, respectivamente: Drawing Hands (1948) e Other World (1947) são do pintor holandês Escher. Ambas disponíveis em http://www.mcescher.com/


Escher é conhecido por pensar parte de sua criação artística, a partir de abstrações matemáticas. O mais inusitado é que suas pinturas retratam imagens que são possíveis apenas matematicamente, isto é, são IMPOSSÍVEIS na realidade, no plano físico. 
A sua utilização por nós se deve justamente para linkarmos a ciência e a arte com a loucura,  já que ambas dão acessos a mundos privados cuja dificuldade em compartilhar-los de forma intersubjetiva é enorme. Nos chama atenção que o cientista, o artista, o xamã conseguem acessar esses espaços mentais, dimensionais e encontrar um caminho que os mantem ligados ao plano "real", enquanto o esquizofrenico parece não encontrar esse caminho de volta, ficando trancado em um espaço mental, em um plano dimensional, trancado por dentro de si mesmo. Sem essa chave, sem essa passagem, ele fica trancado em si mesmo, sem conseguir sair e as vezes dar aceso a ele mesmo. 
Nos parece que a arte é uma forma de expressão que mapeia esse caminho de retorno. Em verdade, não deveríamos pensar a loucura sem aproximá-la da mistica, da arte, da ciência. E acerca disso temos Nise da Silveira como uma referência internacional no seu apelo mais humano.
http://www.museuimagensdoinconsciente.org.br/

Ainda sobre Escher: 






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