Tento escrever sobre esses dois
temas, porque me perguntaram: como é que o despertar da kundalini resulta em
despertar espiritual em uns e psicose em outros?
A pergunta é boa. E na pergunta já se parte de um
pressuposto de que essa tal da energia kundalinica é responsável direta pela
alteração do funcionamento dos mecanismos psíquicos. E nisso se tem um pouco de
razão.
Não buscarei definir nenhum dos dois conceitos.
Partirei do pressuposto que todos já sabem o que é. Não sabendo, encontrarão
definições na web melhores e mais claras. De todo modo, a literatura indiana
ilustra a Kundalini como sendo duas serpentes que ficam adormecidas na base da
coluna vertebral. Quando elas despertam e esse despertar pode se dar tanto por
práticas meditativas como de maneira espontânea, ela vai irrigando todos os
centros energéticos do corpo (chakras) até o topo da cabeça.
Não sou da área médica, nem da psicológica, nem da
terapêutica, arrisco a filosófica, mas vou mesmo enveredar pela literária, de
cunho ficcional. Sou um ficcionista. Deixei no armário a camisa de força e
peguei a fantasia de escritor.
E lá de onde venho, nas histórias encantadas do
mundo assombrado, nunca avistamos nenhum terráqueo que não fosse psicótico. Não
estou falando neurótico não, estou dizendo psicótico. Para precisar ainda mais:
esquizofrênico e paranoico com mania de perseguição. Ambos frutos de medos,
receios, vozes que de tanto serem ditas pelos normais ficam gravadas na memória
e as vezes impossibilitadas de serem deletadas. Já esboço assim, o início de
uma causa que passa desapercebida a maioria. Mas há alguns seres que registram
o universo de forma diferente da nossa. Como uma esponja sugam todo espectro
astral do ambiente que se localizam. Seriam gravadores naturais que
reproduziriam os estados mentais, neurais, emocionais, sentimentais das pessoas
a sua volta, do meio no qual se inserem.
De modo que nos estranha reputar apenas alguns como
psicóticos, quando a psicose parece ser a forma escolhida para se viver no
planeta. Toco esse ponto brevemente e retorno a nossa idéia.
Observem que somos
uma sociedade esquizoide, que separa, classifica e distingue tudo. Quando
alguma coisa sai fora do lugar, quando perdemos o controle das nossas
separações e distinções ficamos perdidos, nos sentimos fragilizados, temos
certeza de que há um complô no universo contra nós, que há forças grandiosas
querendo nos pisar como se fossemos formigas. Nesse momento como autômatos
repetimos o ritual civilizatório que nos ensinaram desde sempre para aplacar a
ira dos deuses, para instaurar, novamente, a ordem em nossas vidas. Nos
voltamos para qualquer símbolo religioso, uma cruz por exemplo, ajoelhamos,
prometemos que não mais deixaremos de fazer aquilo que fazíamos, desde que a
ordem retome a nossa vida. Nos submetemos aos maiores desatinos e absurdos, a
todo tipo de vigarista e charlatões que abusam manipulam não a fé das pessoas e
sim o desespero, a crença e a esperança que temos em algo que seja maior do que nós, que nos transcende, que nos faz sentirmos como formigas, mas que não permitirá sermos tratados como tal. Falo de pseudos pais de santos, bispos,
pastores e um rol interminável de trambiqueiros, nos quais podemos inserir advogados, psiquiatras, psicólogos, terapeutas. Fomos ensinados a acreditar que cumprindo o ritual, o mundo volta ao
lugar. Nas universidades se ensina procedimentos ritualísticos que se aplicados conforme sempre foi feito dará certo, a isso denominamos metodologia.
Mas, como hoje a crença religiosa é tida como mítica e eu sou um dos últimos
a acreditar nesses personagens lendários, fabricaram-se novos deuses: Prosac,
Lexotan, Rivotril e uma série de outros antipsicóticos e antidepressivos. Já
consigo ver daqui alguns séculos a nova Cosmogonia ocidental. No princípio era
a depressão, depois o Rivotril habitou entre nós. Ou outra saga similar, mas
mais à grega. Da desordem psíquica que invadia a mente dos seres, saiu Fobos.
Da união de cortisona e lítio criamos um novo Panteão olímpico, ou melhor,
antipsicótico, hoje dominado pelos imbatíveis Haloperidol e Ferfenazina.
O incrível é que dar lítio para criança, aumentar/diminuir a dopamina das pessoas e outras coisas do gênero, como deixar milhares
de pessoas passarem fome, gastar bilhões com armamento nuclear ou não, é algo
super NORMAL. Ninguém questiona a sanidade mental de Bush, Hussein, Fidel,
Serra, Anastasia, Aécio Neves. São tão normais que chegam a ser nossos
representantes eleitos pelo voto normal da maioria.
Enfim... guerra,
fome, extermínio, destruição em massa, tudo isso é tido
como um comportamento normal, alias, normalíssimo. Para ajudar, estamos
retomando dentro desse prisma algumas forças que estavam escondidas, mas que
voltam a ocupar espaço: diabo, capeta e companheiros do inferno. São eles os
atuais Irresponsáveis por todo tipo de coisa que foge ao ordenamento lógico que
desejamos encontrar na vida. Ontem conversava com Tranca-Rua e ele me contava:
Lúcifer vai se render. Cansou de ser responsabilizado por tudo.
Assim, aos nossos olhos, é estranhíssimo que a
gente repute psicótico, esquizofrênico, justamente aquelas pessoas, que
conseguem ver uma conexão e uma integração nas coisas e nos seres. Aqueles que
conseguem romper com um paradigma cartesiano de idéias claras e distintas, isto
é, separadas, classificadas, racionalizadas como bem pontuou Kant seguindo os
passos de Newton.
E não veja critica a visão de mundo apresentada a nenhum
desses grandes pensadores, pelo contrário, a critica é a quem se diz cientista,
não conseguir perceber que tudo isso é um modelo. A critica é a não criticidade
de perceber que estamos fabricando novos deuses, de um materialismo que chega a
doer de tão hediondamente concreto. Dar antipsicóticos para qualquer um,
especialmente, para crianças é tão absurdo quando a pratica da lobotomia. Mas,
isso é o tempo que vai dizer. Infelizmente, para alguns o bom senso só chega
com a secularização.
De todo modo, vou aceitar a alegação, que alguns
possam estar fazendo de que estou romantizado a psicose. Sim, estou, mas faço
isso para retirá-la da demonização. E entenda-se o tratamento dos
esquizofrênicos com base em lobotomia, internação, dopagem como demonização do
processo psíquico. Sendo assim, eu diria o que Laing (antipsiquiatra) disse na
década de 60/70 estamos psicotizando nossa sociedade e aqueles que de alguma
forma consegue escapar e, ou fugir são diagnosticados, rotulados como
esquizofrênicos, psicóticos. Qualquer um que apresentar um segundo de sanidade
nessa sociedade é convidado a beber cicuta- Sócrates, crucificado- Jesus;
silenciado ou com os livros queimados, quando não o corpo, ou envenenados-
Reich, Osho.
Sei que entusiasmei e não respondi a que me propus,
espero conseguir ou terei que mudar o titulo do que pretendia escrever. É que
os textos são seres vivos, que possuem aqueles que lhes escreve. Quisera eu
conseguir sentar e escrever aquilo que pensei que escreveria. Quando sento e
começo as idéias saltam, as imagens vêm, o discurso se altera, eu sou eu e mais
milhares de inconformados que sabemos fazer melhor e mais acertado. Pelo amor
de Deus, escuta a gente. Nós somos doidos, sabemos, mas nós entendemos dessa
coisa. Nós podemos auxiliar a vocês no tratamento dessas pessoas. Mas é
imprescindível carinho, respeito e se conseguirem amor.
Assim, nosso pedido e a nossa abordagem ficcional
tenta demonstrar que é possível entender esse estado de dentro, por dentro, sem
que para tanto se necessite ficar psicótico, ou menos ainda lobotomizar o
cérebro. Essas técnicas de compreender o outro, esse não eu, a partir de mim
mesmo é amplamente conhecida por xamãs e meditadores. Eles
conseguem fundir a consciência deles a de outros seres, a de outros estados.
Fundem-se, registram, mapeiam, conhecem e retornam. Mas, esse cenário é tido
para muitos cientistas, filósofos como visionário, lunático, esquizofrênico.
Todavia, quer me parecer, que sempre foi esse apelo não local que algumas
pessoas conseguem explorar da sua própria mente, que deu a loucura um ar
sagrado.
Pelo menos é esse enfoque que podemos vislumbrar
com Foucault em A História da Loucura, Vigiar e Punir e com Groff em Emergência
Espiritual. Vejamos:
Muito bom esse texto
ResponderExcluirGrato Paula. Abraço.
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