sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Kundalini e Psicose



Tento escrever sobre esses dois temas, porque me perguntaram: como é que o despertar da kundalini resulta em despertar espiritual em uns e psicose em outros?

A pergunta é boa. E na pergunta já se parte de um pressuposto de que essa tal da energia kundalinica é responsável direta pela alteração do funcionamento dos mecanismos psíquicos. E nisso se tem um pouco de razão.

Não buscarei definir nenhum dos dois conceitos. Partirei do pressuposto que todos já sabem o que é. Não sabendo, encontrarão definições na web melhores e mais claras. De todo modo, a literatura indiana ilustra a Kundalini como sendo duas serpentes que ficam adormecidas na base da coluna vertebral. Quando elas despertam e esse despertar pode se dar tanto por práticas meditativas como de maneira espontânea, ela vai irrigando todos os centros energéticos do corpo (chakras) até o topo da cabeça.

Não sou da área médica, nem da psicológica, nem da terapêutica, arrisco a filosófica, mas vou mesmo enveredar pela literária, de cunho ficcional. Sou um ficcionista. Deixei no armário a camisa de força e peguei a fantasia de escritor.

E lá de onde venho, nas histórias encantadas do mundo assombrado, nunca avistamos nenhum terráqueo que não fosse psicótico. Não estou falando neurótico não, estou dizendo psicótico. Para precisar ainda mais: esquizofrênico e paranoico com mania de perseguição. Ambos frutos de medos, receios, vozes que de tanto serem ditas pelos normais ficam gravadas na memória e as vezes impossibilitadas de serem deletadas. Já esboço assim, o início de uma causa que passa desapercebida a maioria. Mas há alguns seres que registram o universo de forma diferente da nossa. Como uma esponja sugam todo espectro astral do ambiente que se localizam. Seriam gravadores naturais que reproduziriam os estados mentais, neurais, emocionais, sentimentais das pessoas a sua volta, do meio no qual se inserem. 




De modo que nos estranha reputar apenas alguns como psicóticos, quando a psicose parece ser a forma escolhida para se viver no planeta. Toco esse ponto brevemente e retorno a nossa idéia. 

Observem que somos uma sociedade esquizoide, que separa, classifica e distingue tudo. Quando alguma coisa sai fora do lugar, quando perdemos o controle das nossas separações e distinções ficamos perdidos, nos sentimos fragilizados, temos certeza de que há um complô no universo contra nós, que há forças grandiosas querendo nos pisar como se fossemos formigas. Nesse momento como autômatos repetimos o ritual civilizatório que nos ensinaram desde sempre para aplacar a ira dos deuses, para instaurar, novamente, a ordem em nossas vidas. Nos  voltamos para qualquer símbolo religioso, uma cruz por exemplo, ajoelhamos, prometemos que não mais deixaremos de fazer aquilo que fazíamos, desde que a ordem retome a nossa vida. Nos submetemos aos maiores desatinos e absurdos, a todo tipo de vigarista e charlatões que abusam manipulam não a fé das pessoas e sim o desespero, a crença e a esperança que temos em algo que seja maior do que nós, que nos transcende, que nos faz sentirmos como formigas, mas que não permitirá sermos tratados como tal. Falo de pseudos pais de santos, bispos, pastores e um rol interminável de trambiqueiros, nos quais podemos inserir advogados, psiquiatras, psicólogos, terapeutas. Fomos ensinados a acreditar que cumprindo o ritual, o mundo volta ao lugar. Nas universidades se ensina procedimentos ritualísticos que se aplicados conforme sempre foi feito dará certo, a isso denominamos metodologia. 


Mas, como hoje a crença religiosa é tida como mítica e eu sou um dos últimos a acreditar nesses personagens lendários, fabricaram-se novos deuses: Prosac, Lexotan, Rivotril e uma série de outros antipsicóticos e antidepressivos. Já consigo ver daqui alguns séculos a nova Cosmogonia ocidental. No princípio era a depressão, depois o Rivotril habitou entre nós. Ou outra saga similar, mas mais à grega. Da desordem psíquica que invadia a mente dos seres, saiu Fobos. Da união de cortisona e lítio criamos um novo Panteão olímpico, ou melhor, antipsicótico, hoje dominado pelos imbatíveis Haloperidol e Ferfenazina.



O incrível é que dar lítio para criança, aumentar/diminuir a dopamina das pessoas e outras coisas do gênero, como deixar milhares de pessoas passarem fome, gastar bilhões com armamento nuclear ou não, é algo super NORMAL. Ninguém questiona a sanidade mental de Bush, Hussein, Fidel, Serra, Anastasia, Aécio Neves. São tão normais que chegam a ser nossos representantes eleitos pelo voto normal da maioria. 

Enfim... guerra, fome, extermínio, destruição em massa, tudo isso é tido como um comportamento normal, alias, normalíssimo. Para ajudar, estamos retomando dentro desse prisma algumas forças que estavam escondidas, mas que voltam a ocupar espaço: diabo, capeta e companheiros do inferno. São eles os atuais Irresponsáveis por todo tipo de coisa que foge ao ordenamento lógico que desejamos encontrar na vida. Ontem conversava com Tranca-Rua e ele me contava: Lúcifer vai se render. Cansou de ser responsabilizado por tudo.

Assim, aos nossos olhos, é estranhíssimo que a gente repute psicótico, esquizofrênico, justamente aquelas pessoas, que conseguem ver uma conexão e uma integração nas coisas e nos seres. Aqueles que conseguem romper com um paradigma cartesiano de idéias claras e distintas, isto é, separadas, classificadas, racionalizadas como bem pontuou Kant seguindo os passos de Newton. 

E não veja critica a visão de mundo apresentada a nenhum desses grandes pensadores, pelo contrário, a critica é a quem se diz cientista, não conseguir perceber que tudo isso é um modelo. A critica é a não criticidade de perceber que estamos fabricando novos deuses, de um materialismo que chega a doer de tão hediondamente concreto. Dar antipsicóticos para qualquer um, especialmente, para crianças é tão absurdo quando a pratica da lobotomia. Mas, isso é o tempo que vai dizer. Infelizmente, para alguns o bom senso só chega com a secularização.

De todo modo, vou aceitar a alegação, que alguns possam estar fazendo de que estou romantizado a psicose. Sim, estou, mas faço isso para retirá-la da demonização. E entenda-se o tratamento dos esquizofrênicos com base em lobotomia, internação, dopagem como demonização do processo psíquico. Sendo assim, eu diria o que Laing (antipsiquiatra) disse na década de 60/70 estamos psicotizando nossa sociedade e aqueles que de alguma forma consegue escapar e, ou fugir são diagnosticados, rotulados como esquizofrênicos, psicóticos. Qualquer um que apresentar um segundo de sanidade nessa sociedade é convidado a beber cicuta- Sócrates, crucificado- Jesus; silenciado ou com os livros queimados, quando não o corpo, ou envenenados- Reich, Osho. 

Sei que entusiasmei e não respondi a que me propus, espero conseguir ou terei que mudar o titulo do que pretendia escrever. É que os textos são seres vivos, que possuem aqueles que lhes escreve. Quisera eu conseguir sentar e escrever aquilo que pensei que escreveria. Quando sento e começo as idéias saltam, as imagens vêm, o discurso se altera, eu sou eu e mais milhares de inconformados que sabemos fazer melhor e mais acertado. Pelo amor de Deus, escuta a gente. Nós somos doidos, sabemos, mas nós entendemos dessa coisa. Nós podemos auxiliar a vocês no tratamento dessas pessoas. Mas é imprescindível carinho, respeito e se conseguirem amor.

Assim, nosso pedido e a nossa abordagem ficcional tenta demonstrar que é possível entender esse estado de dentro, por dentro, sem que para tanto se necessite ficar psicótico, ou menos ainda lobotomizar o cérebro. Essas técnicas de compreender o outro, esse não eu, a partir de mim mesmo é amplamente conhecida por xamãs e meditadores. Eles conseguem fundir a consciência deles a de outros seres, a de outros estados. Fundem-se, registram, mapeiam, conhecem e retornam. Mas, esse cenário é tido para muitos cientistas, filósofos como visionário, lunático, esquizofrênico. Todavia, quer me parecer, que sempre foi esse apelo não local que algumas pessoas conseguem explorar da sua própria mente, que deu a loucura um ar sagrado.

Pelo menos é esse enfoque que podemos vislumbrar com Foucault em A História da Loucura, Vigiar e Punir e com Groff em Emergência Espiritual. Vejamos: 


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