quinta-feira, 1 de março de 2012

Uma breve História da Loucura




Começando por Focault constata-se que a loucura, a esquizofrenia e a epilepsia eram sagradas, eram tidas como manifestação dos deuses. Essa visão permanece até a idade média, ganhando ares messiânicos. A transformação vai se dar na idade moderna quando desenvolvemos um outro tipo de modo de produção. É sempre interessante constatar como que as mudanças no mundo concreto acionam e despertam novos imaginários, novos desejos e orientações. Naquele momento, todo tipo de ócio era uma espécie de vagabundagem, afinal aquele que não produz é visto como um pária. Daquele momento em diante é que se observa a criminalização do desemprego, da rebeldia, assim como o confinamento dos loucos. É a construção de internatos para punir esses desviantes e a de escolas e fábricas para vigiar e impedir novos desvios. Ou para ser mais preciso, é a universalização da educação para que dentro da escola se ensine o adestramento do corpo na utilização do maquinário fabril. Àqueles que se rebelam contra essa instrução tem-se as cadeias e manicômios. Vigiar e Punir.
É nessa concepção que Ronald Laing[1], David Copper[2] (antipsiquiatras[3]) vão observar a loucura, mais especificamente, a esquizofrenia como sendo política, cultura, industrial, operada dentro das dimensões do mundo do capital e do trabalho. Eles vão dar os passos iniciais para a luta antimanicomial.


Em Emergência Espiritual livro de Stalislav Groff[4] e a sua esposa trazem esses e outros autores como interlocutores ocultos, e, nem tanto, para demarcar que o tratamento que dispensamos aos esquizofrênicos na lógica da produtividade, do trabalho, do individualismo, do capital é sobremaneira diferente das pessoas que vivenciam os mesmos transtornos em culturas tribais cuja lógica é menos individualista e mais coletiva.
Eles salientam que há relatos de transtornos psíquicos em todas as culturas, mas a forma de tratamento dispensada é muito diferente. Essa pessoa que passa por esse despertar espiritual, essa emergência espiritual é afastada do convívio da tribo pelo xamã que a acompanha e a ajuda a mapear sua viagem, sua “cartografia mental”. Sem uso de camisas de força, antipsicóticos, eletrochoques a pessoa vai se afinizando com a sua nova carga energética. Aqueles impulsos loucos e insanos vão sendo controlados e administrados pelo próprio corpo. O próprio corpo vai sendo alterado em conjunto com sua estrutura energética, impedindo os choques elétricos, os curtos circuitos.
O contato direto com a natureza ajuda a mente serenar-se e tranqüilizar-se. Assim como a presença segura de um orientador que: 1- naturaliza e explica os acontecimentos, 2- traduz as vozes, as imagens, as visões; 3- auxilia no contato mais sombrio e obscuro com as sombras, a escuridão, não apenas da própria mente do esquizóide, mas de toda a coletividade que eles fazem parte. O esquizofrênico passa por todo esse encontro, esse percurso interno, no qual o mundo externo se translitera em símbolos internos, até que em um determinado momento do processo irrompem os símbolos pessoais. É este o momento que marca o fim do surto, mas também o início da impossibilidade de retornar ao mundo natural. Nada mais será como antes. Toda a estrutura energética foi alterada. Já não se é mais quem se era. Você voltou a ser ou esta nas passadas de recuperar aquele que você sempre foi, sempre é, sempre será. E daqui nasce uma outra angustia, uma busca por um sentido que não se é dado de imediato, afinal: por que eu? Por que não outro?
Só quem não passou por isso que acha os transtornos mentais fascinantes, maravilhosos. Somente quem observa o resultado final é que lança olhares de admiração querendo ser igual ao xamã, ao médium, ao artista. Porque a vivência do processo é dolorosa. Na sua maioria todos nós gostaríamos de estar fazendo outras coisas, mas não podemos. Perdemos esse direito de escolha. No nível físico, para se ter tranqüilidade psíquica, emocional, mental, você não tem o que denominam de livre-arbítrio. Mas, tudo isso é uma outra história. Agora nos importa sinalizar que em outras culturas se tem outras abordagens, mas em nenhuma delas a crise existencial passa. Você aprende a lidar com o surto e a tratar o de outros no momento oportuno. O aprendizado do surto é a não interferência na dinâmica da energia do outro. É o reconhecimento de que há um processo inteligente que se seguido, se puder se manifestar conduz a pessoa a um encontro consigo mesmo. O surto psicótico pode ser analogamente comparado a um parto. Você pode tê-lo sozinho. Você pode buscar o contato com uma equipe médica, você pode recorrer a uma parteira. 

PARA SABER MAIS:



[1] Aqui o autor apresenta um bom resumo da vida e da obra desse belo ser humano: http://www.cobra.pages.nom.br/ecp-laing.html acessado em 23/02/12

[2] Nunca é das melhores referências, mas na falta de tu, vai tu mesmo: http://pt.wikipedia.org/wiki/David_Cooper acessado em 23/02/12

[3] Discordo da abordagem, da visada, mas ela é boa, ou divertida e faz um contraponto muito especial e até mesmo complementar ao que estou escrevendo, vale a pena dar uma conferida: http://www.olavodecarvalho.org/convidados/victor.htm acessado em 23/02/12

[4] Embora em inglês é possível a tradução pelo próprio Google: http://www.stanislavgrof.com/ acessado em 23/02/12


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