terça-feira, 25 de julho de 2017

CARTA COMO SOPRO INSPIRATIVO.

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No final de mês de maio surgiram para mim duas pessoas atravessando a dificuldade de compreender o desencarne de um ente querido. Uma havia perdido a filha a mais de vinte anos e outra havia perdido a mãe a menos tempo. As ouvi, conversei e essas conversas deixam claro que não há nada mais importante na mediunidade do que servir de ponte entre essas saudades.  


Tendemos a considerar mediunidade o contato estabelecido pelo médium (encarnado) com o plano dos desencarnados. Somater, irmão sideral, foi um dos primeiros a nos alertar para o estreitamento desse conceito e alargar as suas possibilidades e entendimento para toda e qualquer prática na qual nos colocamos como intermediário entre dois planos, dois seres, duas dimensões. Mediunidade assim ganha concepções menos estáticas e abstratas para se fazer no uso e no contato dos seres e entre os seres. O motorista que transporta seus passageiros, os educadores que deslocam mentalmente os seus estudantes, o faxineiro que limpa a sujeira de uma casa/cidade; a médica que promove a cura do paciente, a terapeuta que acolhe e recepciona a dor do seu partilhante. Mediunidade, intermediários entre eles e um outro, uma coisa, um estado, uma ideia, um principio. Um alargamento mental que miniminiza a mediunidade enquanto encontro semanal de uma hora e a expande para um fazer diário de no minimo 16 horas por dia.  


Um dos sentidos, talvez o sentido de ser sensitivo, médium, seja o de fazer ponte, estabelecer contatos e intercessões entre os planos. Pensando mediunicamente, receber notícias de um ente desencarnado, em outra dimensão afaga, alivia, emociona tal qual receber carta de um amigo distante. Nessa reunião que realizamos nosso intuito era proporcionar as pessoas uma escrita. Escrever uma carta para alguém. Os desdobramentos dessa atividade me levaram a pensar em muitas outras coisas, em moldes parecido a pergunta que Waldo Vieira fez ao se dedicar mais as projeções astrais do que às psicografias. A reflexão do médico questionador foi algo como: 'se as pessoas podem conversar com os espíritos conscientemente fora do corpo, porque fico emprestando o meu para receber cartas, transmitir abraços que elas poderiam estar recebendo diretamente?'

Na concepção dele, essa lógica alimentava um estado de coisas que ele não queria fazer parte. Considerou melhor ensinar uma técnica de saída do corpo que permitisse a qualquer um estreitar e conhecer o mundo espiritual por si mesmo. Esse pensamento crítico me veio depois do resultado, quando vi as pessoas lendo as suas cartas e nelas cada um dialogava com as dores do outro. Se não podemos chamar as cartas produzidas de psicografias podemos afirmar sem dúvida que foram cartas inspiradas que consolou cada uma daquelas pessoas que lá estavam, sem que eu e outros médiuns tivéssemos que transmitir o que os amigos espirituais ditavam. Pelo contrário, ao invés de um, ou dois médiuns psicografando tivemos seis pessoas sensíveis que se conectaram e nessa conexão consigo mesmas, captaram o outro, o ambiente. 




O que fizemos de diferente foi novamente caminhar nas pegadas da sensibilidade Consciencial, da estética existencial que os artistas nos apontaram. Apostamos na arte e no que os artistas chamam de INSPIRAÇÃO. 

Nietzsche filósofo alemão nos pergunta se havia alguém no século XIX que soubesse o que é inspiração? E a partir dessa linda pergunta escreve falando como é e o que era escrever para ele. 


Essa escrita como tive a oportunidade de expor, timidamente, no 2° Coloquio Internacional de Metafísica, rememora muito a psicografia. Mas, será a inspiração uma psicografia? Seriam os artistas médiuns? 

Eles dizem que sim e eles dizem que não. Dizem que sim ao afirmarem que o processo de inspiração é uma conexão, um acesso diferenciado as mais diversas localidades subjetivas, que cruzam, parametrizam com estados intersubjetivos e realidades objetivas do outro. Dizem que não, porque não há nenhum espírito soprando, dizendo o que deve ser feito e como fazer. É um estado de sensibilidade, uma consciência que se abre e é capaz de assimilar do seu jeito, no seu estilo, na sua essência o como é para ele. E nessa imersão, consegue-se dialogar, tocar outros universos, outras consciências, independente do tempo e do espaço. 

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O que realizamos foi proporcionar uma 'oficina' na qual esse outro entrava no universo da inspiração e de lá retirava, trazia, aquilo que tinha em abundância no seu balde de alma. Mas, quem tratou com mais naturalidade essa parte foi o poeta português que nos brindou com sua presença e sua inspiração. Falando em seu nome e dos artistas nos deu uma explicação e nos remeteu a uma prática muito suave do que nos levaram a fazer. Uma explicação mais clara de como seria a atividade/oficina a ser realizada. Vou chamar a Oficina de Sopro Inspirativo. 


Um processo de abertura para deixar a inspiração entrar e o hálito criativo sair produzindo uma interação, uma ponte, uma construção, um diálogo entre o eu e o mundo. Uma interação na qual o eu mergulha em si mesmo e retoma trazendo o que encontrou em suas paisagens internas. Nesse encontro, pedimos para cada uma fechar os olhos, respirar, sentir. Minutos depois com o estado vibracional mais elevado, interconectados e conectados aos seus tempos e espaços internos, lhes demos papel e lápis/caneta para escreverem, enviarem uma carta para... tal qual o sujeito esperançoso joga uma mensagem no mar dentro de uma garrafa, na confiança de que o infinito vai lhe dar o leitor correto, o destino certo.
Elas escreveram e depois do término da primeira buscadora, poucos segundos se passaram para o término da última. De uma maneira bem ritmada terminaram duas a duas. E iniciamos o processo de leitura.

Cada uma lia como se estivesse escrito para si e de si mesma. Liam sem saberem que o sentido oculto do exercício era perceber em qual nível, até em que ponto, conseguiram tocar o outro. 
Resultado de imagem para pessoa escrevendo cartaO estranhamento começa quando uma amiga diz clara e em bom tom: “escrevi pensando na sua dor” se dirigindo a outra amiga que perdera o segundo filho por morte matada. Após a leitura eu interrompo e esclareço que toda dinâmica do processo não era apenas a escrita para si mesma, o diálogo consigo. O sentido consistia na percepção e entendimento de como ao acessar seu próprio universo, o outro surge, desvela. Como que nosso discurso toca e chega ao outro.

Prosseguiram as leituras até que novamente na última carta, a leitura de L proporciona choro em C que não tem dúvidas em afirmar que a carta era para ela. Uma carta que falava para a dor de uma amiga que havia perdido um companheiro. Um choro bom é derramado e uma emoção visita a todos nós. O sopro da inspiração se harmoniza na mesma direção da psicografia. E aquela moça, medrosa e resistente quanto a sua sensibilidade, amedrontada e fragilizada pelo seu momento, simboliza como todas as outras, a capacidade de intermediar e se fazer alento, balsamo a quem dói, sofre e busca resposta. 




Eu gostei muito do resultado, porque proporcionou a pessoas sensíveis uma maneira de conectarem-se com elas mesmas. Nessa conexão, elas perceberem que o alcance pode ser maior do que elas mesmas, inclusive, se permitindo acessar, sentir a presença de seres que não estão no corpo físico, mas continuam existindo. Essa percepção amplifica mais os trabalhadores, distribui as responsabilidades que temos em gestarmos e proporcionarmos um ambiente melhor para cada um de nós e todos.  

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