quinta-feira, 12 de novembro de 2015

O MAR DE LAMA

As imagens chocam. Uma barragem de dejetos se rompe e avassala um distrito, muitas cidades, toda uma região, um ecossistema. De forma leiga tendemos a acreditar que esse foi o menor dos males, mas dias depois jornais noticiam que a expectativa é de que os dejetos percorram quilômetros e chegue ao estado do Espirito Santo. É mais do que assustador é avassalador.

Em meio a noticias fico (nós leigos) querendo compreender: se é assim tão perigoso, quais as normas de segurança para a população? Ensina-se para onde se corre nas escolas, nas fábricas? É comum vermos em filmes americanos treinamentos para incêndio. Sabe-se que no Japão há treinamentos para terremotos. Ensina-se para onde se corre e o que se faz. No distrito de Mariana não tinha nem sirene. Não teve aquele cuidado básico de se ensinar para onde se corre, o que se faz. O mais louco, não há nenhuma medida de contenção. Nenhum plano emergencial.

A engenharia hoje consegue planejar o preço que se gasta de um centímetro cubo de água, mas a Samarco, aparentemente, não tinha nenhum plano emergencial. É como se eles tivessem a certeza de que nada, nunca aconteceria. Ou uma certeza pior, a de se acontecer, não daria nada para eles. A certeza da impunidade. Insinuo isso, porque essa é uma falha de engenharia que não se tem há no mínimo três décadas. Digo não o acidente que pode vir a acontecer, mas a inabilidade de remediar a catástrofe, de assistir os vitimados. 

Uma barragem é aos meus olhos, a partir de agora, análogo a uma usina nuclear. Necessita de todas as normas de segurança. Necessita de toda ordem de treinamento e disciplina não apenas para evitar acidentes, mas especialmente está pronto e alerta para responder ao mesmo. Se eles que lidam diretamente com a contenção dos dejetos não sabem o que fazer quem irá saber? Eu?  A população? O Chapolin Colorado? O Estado como querem alguns? O que fez a engenharia, a física, a ciência de modo geral um saber tão mítico não é a sua capacidade de acerto e sim a sua margem de erro. 

É dever moral, contratual de quem explora os recursos naturais saber que já se extraiu tanto que não se tem mais condições nem de armazenamento. É dever moral de quem explora esses recursos ser capaz de medidas mínimas de segurança e proteção ambiental. É obrigação deles saberem o que fazer e como fazer no menor tempo possível. É um absurdo um acidente ter acontecido e ir destruindo o meio ambiente pelo caminho afora sem medidas protetivas aos seres humanos e ao meio ambiente. Em qualquer lugar do mundo isso seria crime contra a humanidade.






II
Tempos atrás conversava com uma amada sobre a mineração. A crise na qual ela se encontra. A forma pouco clara que muitas obtém lucro.
Após essa conversava me veio em ‘sonho’ o livro de Eduardo Galeano: “As veias abertas da América Latina” e junto a isso os seres, as formas, as energias que ficam por trás dessa manipulação de recursos naturais. Seres que na ocasião vi como sombrias, maléficas, exploradoras da força e do trabalho humano. Eram forças que se alimentavam da desvitalização não apenas dos corpos como que da própria Terra. Quanto mais se suga, quanto mais se retira, mais poderosos eles ficam. O poder deles vem da capacidade de gerar miséria, de produzir sofrimento. 


Mentalmente fui vendo as minas na África, na América Latina e como que essa energia de exploração, de danação, de ganância envolve praticamente toda concessão mineral dada no planeta. É avassalador.


Ainda nessa direção energética não pude deixar de associar as empreiteiras nacionais e internacionais, especialmente, no que tange a operação Lava Jato.

Deve ser interessante acreditar que prendendo os donos de algumas se corrigiu a marcha histórica e ética do nosso país. Deve ser bacana acreditar que as praticas corruptas e nocivas executadas por eles começaram na administração petista. Mas, vendo essas forças, o que compreendi é que elas devoram a tudo, a todos e depois jogam fora. Deixam apenas as carcaças, os ossos. Todo o restante, eles sugam, com volúpia, luxuria, de maneira esnobe e sofisticada. Pobre de quem acredita que haverá riqueza e prosperidade lidando com essas forças.



Aqui em Minas as prefeituras tem vendido sua qualidade de vida para obterem esses recursos glamorosos dos bilhões de dólares, de reais. O prefeito de Mariana já disse: “ sem eles quebramos!!!” E o louco é: com eles morremos. É triste e lama-tável que não consigamos fazer política sem pontuarmos todas as ações sob a perspectiva econômica. É uma pena que pessoas, estados, países tenham se tornado refém do capital, que agora, definitivamente, compra tudo, até a qualidade de vida.



III

Mas, coloco isso para pensar politica e energeticamente. Todos sabem da importância de Minas para a ordem das coisas. Foi a extração mineral de Ouro Preto que enriqueceu Portugal e permitiu a revolução industrial inglesa. É ainda de terras mineiras que saem riquezas para se pensar novos desenhos para humanidade.



E, quando vemos o mar de lama tomando tudo. É interessante lançar um olhar simbólico e perguntar o que os governantes mineiros tem feito pelo e para o país? Que tipo de liderança e valores estamos promovendo? Temos dois senadores que um deles está diretamente ligado ao que se denominou mensalão mineiro. Para muitos a forma embrionária com que Marcos Valério conseguiu operar o mensalão da base aliada do governo.

Nessa direção, temos outro senador que enquanto governador concedeu todas as regalias e possibilidades de destruição ambiental para as mineradoras e empreiteiras. Não que isso seja crime, não é, pelo contrário, sinaliza desenvolvimento. No entanto, toda a discussão é: que desenvolvimento queremos e a que custo? Os ambientalistas mineiros tem denunciado os impactos destrutivos dessa política na qual o poder econômico coloniza todo o mundo da vida. Esses ambientalistas são vozes roucas no meio do deserto, não são escutados. Agora mesmo, o atual governo de Minas deu isenção fiscal para a exploração do Nióbio em Araxá. É um preço muito caro, muito alto para ser de 'graça'.   

Nessa tristeza está o povo mineiro, assolado pelo mar de lama que reflete bem o momento trágico, de traição que muitos tem sentido. Na verdade, assinala as forças escusas, escabrosas, escondidas vindo à superfície, tomando a consciência das pessoas envolvidas diretamente ou não. É o mar de lama. Agora literalmente tomando conta dos reservatórios de água, poluindo os rios. Contaminando os leitos dos rios. E nem falamos dos lixões. O que esperamos é que nossos representantes legais e cada um de nós decida a que força seguem.





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