São três textos que tentam dialogar entre si, abraços em todos.
Conta o mito, que o
rei, sabendo das previsões para seu filho, resolveu mantê-lo dentro do palácio,
longe da velhice, da doença e da morte. E conseguiu esse feito por mais de três
décadas, quando o próprio pai do príncipe adoeceu e caminhava para o
falecimento. Nesse ínterim, diante de uma curiosidade tardia, o príncipe
resolve sair dos portões do palácio e nisso descobre a velhice, a morte, a
doença. Retorna atordoado, porque sabe que vivia uma ilusão. Pior, sente-se
enganado e desesperado, já que não sabe como ajudar o seu povo, não sabe nem
como ajudar a si mesmo. O jovem Sidarta, esse era o seu nome, passado algumas
noites, despede-se de seu pai, de sua esposa, de seus filhos e parte para fora
dos muros do palácio. Peregrina e encontra uns monges ascetas que para se
livrarem da morte, da velhice e da doença, meditavam por um lado e negavam o
mundo por outro. Anos passam até que ele abandona esse caminho e em sua despedida,
sentado debaixo de uma árvore, uma maça cai na sua cabeça, ou terá sido uma
figueira? Fato é que ele desperta como Buda, o Iluminado. E a sua iluminação se
faz mediante um discurso denominado o Caminho do Meio.
Paro de falar de
Buda, mas o trago para pensarmos juntos a sociedade atual, pensá-la por um
enfoque, já que há inúmeros outros, graças a Buda.
Numa busca por um
entendimento rasteiro, o palácio, a estadia de Sidarta no palácio pode
simbolizar o ego na sua identificação com o corpo. A sua saída do palácio, pode
simbolizar a busca de alguma coisa que tem em nós. Alguma coisa que deseja a
transcendência e sabe, ou não sabe, como a gente a alcança. O encontro dele com
o ascetismo pode simbolizar o momento no qual o ego se identifica com o oposto,
nega o que se foi, busca, radicalmente, um novo ser. E, finalmente, podemos
insinuar, que o despertar ocorre, quando ego, corpo, alma, espírito se
integram. A integração longe de ser uma mera fusão e simbiose é o
reconhecimento tácito e sutil dos limites de cada componente.
Colocadas essas bases
posso fazer a travessia na barca de Hesse e chegar ao século XXI. O corpo não
quer morrer, não quer perecer. O corpo deseja a eternidade e a forma lógica com
que o corpo pensa o eterno é a tautologia dele mesmo, no caso, a reprodução. Se
tiver filhos, eu serei eterno. Este corpo (masculino) então parte para o
ataque, quanto mais mulheres ele conseguir melhor. Mas, se este desejo do corpo
é infinito, a realidade do prazer é finita. Ele não dá conta de todas as
mulheres, de todos os homens, de sustentar e amparar todos os filhos. O desejo
dele é insaciável, mas as suas condições são finitas. Pelo menos era assim.
Havia um momento na vida humana na qual o corpo não bastava a si mesmo. Diante
das limitações que ele imponha e colocava, os seres buscavam uma
transcendência. Hoje....
Temos toda uma
indústria farmaceutica que busca encapsular a eternidade. Tentam persuadir a
todos que a morte é uma falácia, nenhum corpo precisa de morrer e prolonga-se a
vida. Ainda que cada vez mais viver perca o sentido, mas vive-se, recusa-se a
morrer e o que faz parte da mesma estratégia, recusa-se envelhecer. Assim, na
mesma corrente tem a indústria dos cosméticos que sonham em produzir o elixir
da juventude. Ser eternamente jovem é a idéia salvifica do corpo que hoje encontra
respaldo na tecnologia da ex-tetica. E qual é o símbolo maior da vitalidade
humana, senão o sexo.
Assim, também se vende
a esperança do sexo eterno. O Viagra é um sucesso. O prazer químico, a
excitação química, não importa se não sinto desejo pelo ser que possuo, ao
tomar a pílula azul, o pênis fica rijo, endurecido de um desejo que nem carece
ser meu e a copula acontece. A salvação de mim mesmo, mediante a reprodução de
novos corpos se faz eterna, já se fazia anteriormente com a inseminação
artificial, que garante a gravidez para mulheres acima dos 40, dos 50 anos. Mas,
agora, ela acontece, pode acontecer pelas vias “naturais” da copulação e não
pela frieza tecnológica.
Enfim, a tecnologia
quer eternizar o corpo e poderíamos falar ou pensar os atletas,
dos dopings e outros casos, mas a idéia é contrastar tudo isso ao
esvaziamento da morte, da dor e da velhice. Ambas estão sendo varridas para
debaixo do tapete, similar ao que o pai de Sidarta fez com ele para que seu
filho nunca fosse Buda, ou alguém imagina Sidarta, o Buda, tomando Viagra?
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