Desde o
dia 7 uma inquietude me agita. Estava dando aula no 1º ano, quando uma aluna
disse que amanhã elas estariam dispensadas. Não entendi o motivo e quase me
zanguei. No que ela me explicou se tratar do dia 8. Mas, aí olhei para ela,
olhei para as outras alunas, imaginei todas minhas alunas e tive que fazer a
pergunta: vocês são mulheres?
A
pergunta é cretina, eu sei! Mas o que eu queria discutir é se elas se viam
mulheres, não enquanto gênero. Eu na minha ignorância estava me perguntando: o
que é SER MULHER? Por que dentro do meu imaginário, simplesmente, elas não se
encaixavam.
Sei que
o que é SER MULHER é outra pergunta absurda, ridícula, mas diante do meu
imaginário e a presença física de cada uma delas, eu tive que a realizar.
Nisso, uma aluna me disse que já se nasce mulher. Eu, rapidamente, recupero
Simone de Beauvoir e fico pensando comigo mesmo... será? Enquanto gênero eu
concordo. Enquanto gênero, elas são mulheres desde o quinto mês de gravidez,
mas isso ainda não é ser mulher. Nascer mulher não é ser mulher. Parece que o
SER mulher é uma construção social repleto de hábitos, costumes, desejos. Hoje
há uma universalização e plastificação das identidades, mas já houve tempo que
as mulheres nórdicas, guerreiras e combatentes eram tidas como homens para os
romanos que deixavam suas mulheres em casa e possuíam outras ocupações.
Na
minha juventude, isto é, no milênio passado, alunas não recebiam parabéns pelo
dia das mulheres. Era notório na mentalidade da maioria, inclusive delas
mesmas, que elas não eram mulheres na acepção maior do termo. Hoje não. A
maioria das alunas da sala se reconhece e se afirmaram mulheres. O que
inicialmente é bom, mas como pai eu fiquei super preocupado. Explico a
preocupação mais no final.
Uma
aluna me disse: “ se eu trabalho, cuido de casa, cuido dos meus irmãos, estudo;
eu sou mulher!” Como dizer o contrário? Se uma garota de 16 anos trabalha fora
para ajudar em casa, se a outra cuida dos irmãos para que os pais trabalhem
fora, se a outra tem a vida sexualmente ativa, como não compreendê-las como
mulheres? Por que eu fico desafiando o bom senso e também não concordo, dizendo simplesmente: sim
vocês são mulheres?
Simplesmente,
porque como me disse outra: “ uma semente, ainda que não plantada já é um
fruto. Uma maça mesmo verde, já é maça.” E eu aproveitei a metáfora do fruto,
pedi desculpa pela grosseria, mas tive que dizer: sim, mas o fruto verde, ninguém
come.
De modo
que o ser mulher é uma discussão sobre a mentalidade e também sobre a
sexualidade. Algumas quiseram ligar o ser mulher a maternidade, mas nem
precisei entrar no mérito, porque muitas objetaram essa visão. Falando que não
achavam a menina grávida de 13 anos mulher. Outra, já revoltada comigo, me
perguntou: “ e o que é ser homem?” E isso é tão mais claro, tão mais tranqüilo,
tão mais límpido. O homem é homem desde o nascimento, mas podemos demarcar sem
maiores implicações- infância, adolescência, juventude, adulto.Poucos alunos se
aborrecem quando chamados de jovens e salientando- vocês não são “homens”
ainda. Essa clareza esta sendo perdida no universo feminino. Todas já se acham
mulheres, independente da idade. Meninas de dez anos se vestem como “mulheres”
de vinte e cinco. Passam maquiagem como mulheres de trinta. Meninas de quinze,
dezesseis anos entram no bisturi como se tivessem quarenta, cinqüenta. E
mulheres de sessenta usam mini-saia como se tivessem treze. Esse fenômeno é
estudado por outro viés, mas aponta para as diretrizes da sociedade de consumo
que tem como vigor e centralidade das suas informações a juventude.
O ideal
primaveril, jovem, sarado, gostoso, bonito, novo no qual todos devem se
submeter. As rugas são proibidas, as celulites um atentado ao pudor. Toda pele
tem que ter a marca de vinte e poucos anos de idade. Nessa toada, nossas alunas
não podem ser mais crianças, menos ainda adolescentes, agora não podem nem ser
mais jovens; são mulheres no sentido adulto do termo.
Essa é
a minha preocupação. Há uma pressa para ser mulher que só agrada a pedófilos e
tarados. Há uma forçação de barra para o amadurecimento que chega a ser
grosseiro, temerário, escandaloso.
Ao
final, eu disse para elas que o meu receio em cada uma delas em se ver mulher e
se achar mulheres no sentido adulto do termo é que provavelmente aos 19 anos elas
vão se casar, terão filhos, cuidarão da casa, do marido sem antes ter
desfrutado dos encantos da feminilidade. Mais trágico ainda, aos meus olhos, é
que elas estarão e estão prontas para o abate. Elas são presas fáceis para
pedófilos, conquistadores de todo monte. Alguns podem estar se perguntando, mas
não foram sempre? Antes a inocência protegia. Agora, sem inocência, precisa-se
ter uma maldade, uma malícia que provavelmente não se tem aos quinze anos, pelo
menos não para confrontar com alguém de vinte e cinco, trinta anos ou mais.
Falei
mas não defini o que é Ser mulher para mim; faço isso no post seguinte.
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