O contato com a luz produz sombras. O contato com as sombras
gera luz.
Sombra é uma coisa que nós espiritualistas
corremos e não gostamos. Sombra, ego são palavrões que a gente acha que não
podemos ter. No imaginário dos espiritualistas cada um é um ser de luz imenso,
grandioso, radiante e muitas vezes se comportam para que sejam assim e muitos
até são. No entanto, poucos percebem que quanto maior a luz, maior a sombra. E
como a sombra entre nós é algo terrível, nós passamos a combatê-la.
Como a maioria dos espiritualistas se vê,
se entendem, se projetam como sendo um mestre ascencionado, um anjo humano, um
espírito humilde, endividado, mas devotado ao mestre Jesus, combate-se aos
outros. Na verdade, massacra-se o outro. As listas de discussão dos
espiritualistas é um campo de batalha na qual os cegos (eu inclusive), se digladiam
para destruir o outro. Essa percepção quem me passou foi mestre Yub- a de que
espiritualistas não lidam com sombras e aspectos sombrios da própria psique.
Tentar aplicar esse mesmo universo no mundo virtual foi um pulo para que eu
entendesse como que pessoas que falam de seres arque angelicais, não humanos,
intergalácticos, superiores tinham comportamento acerca do outro tão bestial e
brutal. (Volto a insistir que não estou me excluindo disso). É que as listas
virtuais, os pontos de encontros físicos dessas pessoas se transformam no campo
projetivo. Eu não vejo em mim, cego que sou, reconheço no outro, monstro que
ele é.
Talvez isso seja benéfico, mas um pouco
mais de conhecimento acerca de nós mesmos, um tanto mais de tolerância por nós
mesmos, resultaria em coisas diferentes e num crescimento menos doloroso para
todos.
DISTINÇÃO ENTRE TREVAS E SOMBRAS
Eu gosto de trabalhar com o que as pessoas
denominam trevas, sombras. E quero salientar uma distinção entre uma e outra a
partir de conversas com mestra Elo. A sombra é refrescante (pensando em uma árvore)
agradável, assustadora, mas não faz mal, não prejudica. A sombra é parte
integrante da luz. Um professor da federal em suas aulas sobre Habermas e a filosofia
da linguagem gostava de nos lembrar que "ninguém pode desgrudar de sua
sombra." Isso para mim é um koan e fiquei pensando em inúmeras situações e
possibilidades em se romper com a própria sombra. Não as encontrei.
Fala-se de ascensão, de caminho
espiritual, ignorando o ego e as sombras, mas não há possibilidade de ascensão
sem sua sombra. E não existe iluminação de sombra. Existe aceitação da sombra.
Aceitar a sombra implica que a luz incomoda, cega e é chata demais. Seres
luminosos na Terra são pessoas chatas. A Terra física não é lugar para seres
iluminados. Imagina o sol a noite, durante todo tempo? Uma hora alguém suplica:
"Filho, eu quero dormir!" E Apolo (sol) diz todo portentoso:
"minha missão na vida é te iluminar, esclarecer!" Tem sentido isso?
Para mim quem faz isso é um chato. Lembra-me uma situação inversa, mas
idêntica. Alexandre passando pela Grécia foi procurar Dionísio, o cão. Este,
como de costume estava dentro do seu barril. Alexandre na sua magnificência o
chama e estreitando conversa diz: “grande filósofo! Peça qualquer coisa que eu
te darei.” Todos, inclusive Alexandre, esperavam que Dionísio pediria algo
grandioso, mas o cão, na sua forma cínica de ser, apenas disse: “saia da frente
do meu sol.”
Um homem que se contenta com o sol, que tem o sol e a natureza não
tem nada que possa fazer com que outros o bajulem. E isso me remete aos mestres
do espaço, que nos chegam escondendo sua luz. Eles ficam até mesmo dentro do
barril. Todas as vezes que falo disso a imagem que me vem a mente é o arcano IX
do Tarot de Marselha.
O ermitão, assim como os mestres sabem que a luz fere, machuca,
cega, tonteia. Ter a medida correta da iluminação é sabedoria. E a justa medida
é a capacidade de dar a intensidade correta, mediante a necessidade do outro. O
respeito ao outro garante a luminosidade, porque o importante não é a luz.
Acender luz é simples. Ate meus amigos trevosos sabem acender luz. E nunca na
história da humanidade se achou tão luminoso quanto na idade média no período
da inquisição. Acender luz é fácil, mas não é isso que os mestres consideram
relevante, porque a luz não pode ser acesa de qualquer jeito. A relevância esta
no respeito incondicional do outro permanecer no escuro. Está na aceitação
plena de que mesmo podendo mais, você assegura ao outro, apenas o que ele
pleiteia. E o mais louco disso tudo é que você está lá por si mesmo, assim não
lhe cabe mandar, apenas servir. Se você é um ser iluminado que saiu de outra
galáxia e veio aqui para Terra, problema é seu, escolha é sua, não venha acusar
os humanos de ingrato. E nem esperar que se reconheça a sua luminosidade
intergaláctica. Enfim, deixe de ser chato.
Mas a distinção a ser feita é que a sombra
é parte da luz. E quanto maior a clareza e aceitação tivermos dela, mais
reconfortante ela é para o outro. As pessoas não chegam aos mestres devido a
sua luz. Geralmente, a gente nem consegue aquilatar a luz deles. Quando um
Buda, um Krishna, um Jesus, um Sai Baba esta entre nós, poucos chegam até ele
para obter conhecimento. As pessoas chegam até eles para serem consoladas,
compreendidas, aceitas, amadas. É a sombra delas que acolhe, que recebe as
pessoas. A luz delas é o que faz com que as tema. A luz deles é o farol que nos
assinala a sua localização, mas é a sombra deles que nos reconforta, que nos
acomoda em nós mesmos, que nos coloca em direção a nossa própria luz. Talvez essa
seja a grande distinção entre o verdadeiro mestre e os falsos profetas. Aqueles
salientam que a luz que eles vêem no mestre é reflexo da luz deles. Estes vivem
de cegar os outros com a sua luz.
Então, finalizando. Atualmente, ser guerreiro esta em moda de
novo. Mas é preciso frisar que ser guerreiro da luz não é combater sombras em si
ou dos outros. Ser guerreiro da luz é combater as trevas. Coisa completamente
diferente de sombras. As trevas é a cegueira da luz diante de sua sombra. É a
intransigência da sua sombra, perante sua luz. Essa tensão, esse nível de
desgaste é o que vou chamar de trevas. Isto é, a luz impedida de iluminar e a
sombra impedida de confortar. O acumulo disso por anos, séculos, milênios são
as trevas, que a gente guerreia.
O pedido a ser feito é: não guerreia não.
Combata, com elegância, com destreza, mas sem fazer dela sua inimiga. Ela pode
ser a sua inimiga, mas você não precisa ser o dela. E isso não implica em
concordar, acatar, temer. As trevas devem ser respeitadas, mas nunca temidas.
Eles ainda não conseguiram armas contra a iluminação. E não há nenhuma treva
que resista a iluminação; em qualquer lugar, em qualquer tempo, um pau de
fósforo derrota as trevas. E é essa premissa que por ignorância nossa acaba
alimentando e fortalecendo as trevas.
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