Eduarda foi a aluna, que
me apresentou ano passado, o livro: “A culpa é das Estrelas.” Leitora assídua,
devorava o livro com a intenção de terminá-lo antes da estreia do filme. Gosto quando
as pessoas estão dentro do livro, imersas na história criada pelo autor,
encontrando um espaço entre as pautas para que elas caibam. Ela estava assim,
se esgueirando entre a estória maravilhosa do livro e a chatura de um professor
que a puxava para vida, a retirando de uma das entrelinhas do livro. As entrelinhas
entre as palavras têm infinitos só preenchidos com a historicidade do leitor,
tornando cada livro, frase, única para cada um, não que lê, e, sim, que entra
nesses espaços infinitos criados pelo autor. Eduarda pegou um desses caminhos
de minhoca e quase me puxou para dentro do livro, eu resisti... infelizmente,
mas estou muito feliz e satisfeito com os mais vendidos.
Tenho me impressionado,
positivamente, pelos atuais best sellers. Primeiro, “A menina que roubava
livros”, agora, a “Culpa é das Estrelas”. O filme é de fato belo. E, a beleza
do filme é tratar de assuntos tão densos, tão pesados de uma forma tão leve;
refiro-me ao câncer e a morte. Mas, o que eu quero mesmo é tratar desse hiato,
dessa lacuna entre um acontecimento e outro. Quero falar do infinito, do
paradoxo de Zenão de Eléia, da renormalização da física quântica para que as
fórmulas não caia no absurdo. Quero falar do interminado.
Interminado não é uma
palavra dicionarizada, pena, porque interminado no texto tem a função de aludir
àquilo que não se termina. Mas, que não é algo interminável. O interminável parece
ter a vida toda e todas as existências para acontecer, já o interminado é o
oposto, o antônimo, já que representa, algo que finda antes de termos chegado
ao fim. O interminado é similar ao não acabado. Aquela concepção freudiana que
ganhou matrizes existencialistas de que o homem é um ser inacabado, um ser por
fazer, um projeto. O interminado é esse mesmo lançar rumo às incertezas do
infinito, sem que o alcance. Esse hiato, esse lapso é o interminado. É basicamente
sobre ele que falamos.
O interminado permeia
todo o filme, está em toda vida. O interminado é esse final da vida antes da
despedida. É o aperto de mão sem a possibilidade de um abraço. É o primeiro
orgasmo que será contabilizado como a última transa. O interminado é o fim que
chega, a dor que arranca, a perna amputada que ainda tenta andar. O interminado
é esse flerte miserável e compulsivo, obsessivo da vida, com uma paixão latente
pela vida, que acaba se encontrando com a morte. O interminado é a paixão que
acaba antes do amor morrer, ou o amor que cessa sem avisar. O interminado é a
dor da escala 10 da personagem.
Durante o filme não
derramamos uma lágrima sequer para a morte, não é ela que nos causa espécie, o
choro vem pela brevidade da vida. Nos causa lágrimas esse encontro certo, inexpugnável, mas
que nos choca todas as vezes que acontece... o interminado. Como somos
dependentes do depois do amanhã. Como carecemos de uma consequência de fatos. Como
somos frágeis diante do fim inesperado, do interminado. Os dois jovens do filme
não se conformam ( talvez mais ele do que ela) do livro terminar no meio de uma
frase. Mas, na realidade, quantos de nós terminamos alguma coisa quando queremos?
Quem termina uma paixão na hora que deseja? Quem cessa uma transa na hora que
quer? Quem se prepara para a morte antes de ela bater na porta e quando ela
bate, já levou. Nossos personagens vitimados pelo câncer desde tenra idade,
flertam com a morte e o que ela tem de mais belo, o interminado. E eles ensinam
cada uma das pessoas do seu convívio a viverem melhor, a serem melhor. Eles transformam
o intermindado em infinito. Não um infinito interminável, mas o infinito que
faz o sorriso do filho, o olhar da mãe, o beijo da amiga, as mãos dadas com a
mulher que se ama ser eterno. Uma eternidade fugaz, breve como um segundo, mas
profunda como o infinito. É sensacional saber que os jovens estão lendo isso. É
sensacional saber que essa gratidão de ter estado com uma pessoa por um
instante faz valer toda uma existência de dor. Um único segundo de amor. Uma única
bafejada de carinho, um hálito de esperança proporcionado pelo ser que nos ama,
faz toda uma existência valer a pena. É sensacional saber que esse amor está
sendo vivido na Terra. E mais ainda que jovens de 15, 18, 20 anos estão
aprendendo sobre ele. Um amor que fui re-conhecer aos 40 e que alguns morrem
aos 95 sem nunca ter conhecido. Amei essa brevidade nas entrelinhas do livro.
Outra brevidade não menos
importante é a de que nós precisamos do adeus, das despedidas, do último
abraço. Nós precisamos dos finais, quando ele não acontece ficamos no vácuo e o
vazio acaba nos preenchendo. Em alguns o vazio preenche todos os espaços, corrói
tudo o que havia, ficando uma dor que dilacera. Em outros, o vazio é preenchido
por outros instantes, ou pela gratidão de um infinito proporcionado por uma
transa, um sorriso, uma convivência, uma amizade. É estranho como que o amor, a
gratidão é capaz de preencher o interminado com um sentido que ocupa toda vida.
Possibilita a eternidade na palma da mão. Possibilita a arte, a redenção, a transcendência.
Possibilita o amor e o melhor de cada um de nós.
Sejamos...
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