domingo, 12 de janeiro de 2014

Unificações ou tentativas



Alguns usos, termos, conceitos não sabemos ao certo de onde vêm, como nascem. O termo ‘criança interior’, ‘feminino ferido’, ‘sombra’ fazem parte desse jargão. Já ouviram falar disso?

Alguns sim, outros não. A maioria deles deriva, ou se fundamentam na analítica junguiana. Jung, um psiquiatra suíço, discípulo de Freud, para muitos o “príncipe herdeiro” buscou na mitologia, na filogenética e ontogênese coletiva o entendimento desses que se tornariam mais tarde conceitos. Partindo de estudos filológicos, mitológicos, psicanalíticos, o psiquiatra suíço encontrou ‘estruturas’ psíquicas que iam além do aspecto sexual demarcado por Freud. A tentativa de compreender esse espaço, esse território explorado pelas artes divinatórias (astrologia, tarot, I Ching), por loucos, filósofos, artistas, ajudaram a refletir a imagem de arcabouços psíquicos inerentes a todos os humanos, pouco explorado e abordado pela ciência oficial. Sendo que, a pouca exploração desses espaços acabam resultando no apartamento do individuo com o cosmo, nas doenças mentais, nas neuroses como diagnosticou Freud. Esse é um campo de muita pesquisa, de muita literatura, com muita informação que grande parte dos psicólogos possui.

Alguns devem estar se perguntando: ‘qual a importância disso na vida humana, concreta, palpável? O que muda na vida de alguém apropriar-se desses conceitos e conscientizar dessas experiências?”
E a resposta mais sincera é: tudo e nada. A) Nada, porque caso não saiba da existência desses conceitos, ou quaisquer outros de qualquer natureza, não muda o fato de que ele existe e que a pessoa pode saber lidar com ele muito bem. Como Krishnamurti enfatizou milhares de vezes: “a palavra não é a coisa.” Nós lidamos com essas coisas, independente de sabermos ou não. B) Tudo, porque se formos capazes de compreendermos o conceito, de observarmos em nós o fenômeno temos melhores condições de lidar com a situação. Exemplificando- a força que atrai os corpos em direção ao solo sempre existiu, mas é com Newton que a gravidade passa a existir. E de posse do conceito de gravidade fomos capazes, enquanto humanidade, de mudarmos nossa relação com o espaço, com a densidade, enfim, revolucionamos o nosso fazer no mundo.

E aqui estamos diante de um impasse. Epistemologicamente nós avançamos cada vez mais rápido e com mais segurança. Não sabemos para qual direção avançamos e menos ainda o que esse avanço representa, de todo modo, crescemos, expandimos no terreno intelectual, na área da informação. Proporcionalmente, no quesito emocional não avançamos. Não porque falta conhecimento é que o campo emocional é de fato encarado como sendo de menor importância e relevância. Os psicólogos, os terapeutas estão aí e não me deixam mentir. Parte do sofrimento humano é destratado, ignorado, subestimado, negligenciado porque não confiamos que exista ferramentas competentes para auxiliar e que esses ‘males’ são oriundos da mente/alma e não do corpo. Nessa direção de desconfiança se aposta na psiquiatria, ou melhor, na hipótese de que sendo o nosso corpo uma máquina, a psique não é nada diferente, de tal forma que se pudermos ajudar a fisiologia corporal fabricar os hormônios que lhes faltam, curaremos as doenças da mente, da alma. Nada mais lógico, mas nada tão falso. Assim, o universo emocional continua inexplorado, já que a natureza dele não é a mesma do corpo, pelo contrário até. O corpo como máquina é uma relação possível, mas a alma/mente como máquina é uma comparação equivocada que acirra a dor, o sofrimento.


A divisão entre corpo e mente se acentua. O corpo fica por conta da medicina e a mente/alma por conta das religiões. Os intermediários ficam sem um lugar, mais precisamente, ocupam um lugar que recebe a desconfiança dos doutos de um lado, dos religiosos do outro e o desconhecimento da população de forma geral. Afora esse lugar ingrato ocupado entre psicólogos, terapeutas, filósofos clínicos e tantos outros há entre nós a posição ora iconoclasta, de vanguarda que cai em rebeldes sem causa, ora a visão proselitista de que fora da ‘nossa abordagem’ não há vida inteligente e possibilidade de triunfo.
Mas, escrevo tudo isso, porque eu gosto das pontes, das travessias, da união entre os mundos, da complementaridade dos opostos. Gosto das combinações e do trabalho de mesclar, unificar, tentar deixar claro aos opostos onde eles estabelecem intercessões. E, agora estou na fase de buscar, pesquisar, explorar, estudar essa intercessão no espaço psíquico. Primeiramente, busquei isso no espaço religioso, depois no filosófico, em seguida no cientifico. A tudo isso resolvi denominar energético. Agora, há cinco anos, mais ou menos, três com mais dileção, tenho acompanhado o espaço psíquico.

II

O espaço psíquico é imenso, incomensurável. A cada movimento fico mais intrigado com o alcance desse universo. Mas, como um explorador, eu gosto é de verificar as fronteiras, os limites, precisar onde a savana se torna caatinga, onde o mar vira sertão, onde o cerrado se translitera. Foi por essas vias que me dediquei, pesquisei e estudei as fronteiras do espiritual. Passei uma boa parte da vida lendo, freqüentando esse universo espiritual tendo na Filosofia a ponte que me permite transitar entre esses universos, saber para onde apontam, conhecer os seus limites, mesmo quando afirmam não ter.

Concomitante a essa busca, sempre houve a das unificações e foi visitando o universo da Física que me ficou claro que elas não são apenas possíveis como são elegantes, no sentido matemático do termo. A história da Física, que tem sido o modelo de ciência e cosmovisão é a história das unificações: Platão (o ser e o não ser); Newton (mundo sub e supra lunar); Einstein (tempo e espaço); e agora a tentativa do campo unificado ou teoria de Tudo. Nesse olhar, meu orientador, um físico, me ensinou que o conhecimento se dá não meramente no acerto, mas na margem de erro. Quanto mais precisa a margem de erro, mais proximal o conhecimento. A busca então é pela margem de erro.

E dentro dessa margem de erro a pergunta inicial é: onde o universo espiritual, externo aos sujeitos se encontra com o universo psíquico, interno ao individuo? Na mesma linha e direção, onde e em que ponto esse espaço psíquico é espaço mental, corpo emocional? Essa tem sido a minha investigação, o meu olhar. Tentar compreender como que a partir do que espiritistas e espiritualistas denominam ‘freqüência e sintonia’ cada um de nós co-cria um universo envolta. E como que a partir dessa freqüência vibracional somos capazes não apenas de alterar a fisiologia mental, emocional do corpo, como também situações de nossas vidas (relação amorosa, profissional e tantas outras), como também em muitos casos, positivamente, ou não, a de outras pessoas.

De modo que esses espaços, esses lugares tem irrompido diante de mim em alguns atendimentos. Foi nisso que elaborei uma vivência denominada “ACOLHENDO O FEMININO”. A proposta era lidarmos com o feminino, independente do sexo. Perceber como que esse feminino esta negligenciado, excluído, sem lugar não apenas dentro da nossa sociedade, como que dentro de nós mesmos também e principalmente.

Tudo corria bem, até que Primavera me falou da ‘criança interior’ conceito que ignorava a procedência, a finalidade, o sentido. Parei, observei, fui buscar. Na busca li sobre as queixas de abandono, negligência a nossa criança interior. Era como se eu estivesse lendo sobre o feminino. Até mesmo as imagens que reproduzem mitologicamente, oniricamente um e outro se afinizam: o circulo, oroboro, a androgenia. Ambos (feminino e criança interior) são vistos pelos especialistas como o pote de ouro para uma dimensão mais integrada da nossa estrutura psíquica.

Tudo isso me levou a pensar: qual é a distinção? Qual a diferença entre um conceito e outro? Haveria de fato alguma? Estaríamos falando da mesma coisa utilizando nomes diferentes?

A criança interior é um ente real. Fomos crianças. Vivenciamos e experimentamos a infância. Para muitos é a melhor fase da vida. Temos assim essa criança real que fomos e a criança que somos convidados a renunciar, a nãos ser mais. Todos nós somos chamados para o crescimento e em nossa concepção crescer é matar a criança, deixar de ser criança. Na maioria das pessoas a criança fica restrita ao fundo, do fundo, do fundo do espaço psíquico. Não se dá a ela nenhum espaço, nenhum lugar, mesmo quando a vida nos chama.

Mas, esse é também o lugar do feminino na sociedade atual. E, se psiquicamente podemos falar de uma bissexualidade, ou mais precisamente de um hermafroditismo que caminharia rumo à androgenia, cadê o lugar do feminino em nossa estrutura psíquica?
Esse como tenho observado mais atentamente é uma fenda, um vão, um espaço aberto, não preenchido. Falaremos desse lugar, assim como da criança interior em post futuros, agora quero apenas mencionar o fato desses dois conceitos estarem na literatura sobrepostos. Na estrutura psíquica não. Eles denotam lugares diferentes, funções diferentes. A criança interior é um reflexo da criança que fomos, das carências, angústias, tristezas, represálias, alegrias, satisfações, prazeres, que encontramos durante a infância. A questão dela e que trataremos adiante é que a infância nunca acaba, nunca cessa, nunca finda, pelo menos não psiquicamente. O cessar da infância psíquica é o surgimento do adulto, do adulterar, essa é a primeira ou talvez a única traição. Já o feminino é um ente não tangível. Tudo em nossa sociedade remete a negação do feminino, desde o estereótipo associado às mulheres até o inefável, esse intangível relacionado ao imaginário.  De forma que esse espaço fechado, escuro, esse deposito de todas as negligências, que não vemos em nós, Jung denominou de sombra. Ao que tudo indica a sombra é formada pela negação do feminino, da criança interior e de tantos outros ‘objetos’ mentais, emocionais, instintivos que carregamos em nós.


Finalizando, o ponto que quero destacar com maior destaque é que há técnicas energéticas que colocam o partilhante diante desses espaços, dessas carências, dessas lacunas. Nessa hora, até onde consigo compreender o denominar, o conceituar pode ajudar; com isso, quero dizer, que há uma parte do trabalho energético que necessita da fala, da palavra, do conceito. Nessa direção acredito, que o trabalho de psicólogos, seriam abreviados se eles fizessem uso de alguma dessas técnicas bioenergéticas. Pois, elas vão aonde as palavras não chegam, onde o outro não verbaliza, onde às vezes, ele não vê. A consciência desse espaço por parte de trabalhadores do emocional ajudaria a clarear esses espaços taciturnos dentro da gente. Esses espaços que para serem vistos, se mostrarem acabam irrompendo como ataque, ou como denominou Jung- sombra. A sombra para se mostrar, se fazer visível, muitas vezes, senão todas irrompe contra o próprio sujeito.

Para visualizarmos nossa sombra, sabermos o que de fato ela projeta, precisamos casar a acolhida do emocional à metodologia e ferramentas do mental. Esse é um belo trabalho, uma linda jornada para todos aqueles que escolheram essas navegações. É isso que temos realizando assim como muitas outras pessoas.


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